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Como praticar a arte da escuta? Júlio Machado Vaz

1:08:20
 
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Manage episode 432214622 series 3444813
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Busco a escuta perfeita.

Não a escuta do som, mas também essa.

Busco essa afinação perfeita entre a fala e o silêncio.

Onde cada respiração pode descobrir a raiz de uma dor de alma.

E onde a empatia é o instrumento que abre espaço à confiança obrigatória para que quem sofre possa falar, e quem ouve possa escutar.

Sigmund Freud inventou o sofá que fala.

O sofá onde todos nos podemos deitar para falar connosco próprios sabendo haver um psiquiatra, psicanalista ou psicólogo na cabeceira dessa cama existencial para nos ajudar nessa caminhada por entre sintomas, dores, desejos e desejadas ressurreições de alma.

Nesta edição vou guiado pelo psiquiatra que conheci como ouvinte há mais de 30 anos quando ficava colado à telefonia para ouvir o seu programa “O sexo dos anjos”

Um roteiro que começou por ser uma ideia de programa para falar de sexualidade, mas acabou por ser um manual sobre a natureza humana.

Portanto, conheci o homem da rádio muito antes do psiquiatra e do professor de antropologia médica.

Esta conversa poderia demorar 10 horas. Até poderia ser um diálogo em associação livre, mas escrevi demasiadas perguntas para tantas respostas.

É uma lição sobre como ouvir os outros, como praticar a arte da escuta e de aceitar e compreender o outro como ele é.

Falámos de diálogos, palavras e silêncios.

A empatia a par das nódoas negras e das grandes alegrias são provavelmente a única receita para a partilha entre seres humanos.

Compreender os outros implica-nos a todo o momento.

E as máquinas, capazes de calcular rapidamente e guardar acervos de informação gigantescos não tem alma.

Podem saber. Podem fingir. Mas nunca sentiram a palpitação dos grandes amores nem o sabor das lágrimas.

Nem sequer lágrimas de óleo ou taquicardias elétricas.


TÓPICOS:

Início (00:00:00)

Introdução ao Tema da Escuta (00:00:12)
Discussão sobre a escuta e a importância da empatia na comunicação.

Apresentação do Convidado (00:02:27)
Júlio Machado Vaz é apresentado como médico psiquiatra e influenciador.

O Programa “O Sexo dos Anjos” (00:02:50)
Júlio fala sobre o seu livro e a história do programa de rádio.

Impacto do Programa (00:03:14)
Discussão sobre a influência do programa na sexualidade e na sociedade.

Relação entre Rádio e Televisão (00:05:02)
Comparação entre os meios de comunicação e as suas diferenças na recepção do público.

Censura nos Média (00:06:21)
Júlio compartilha experiências de censura e a diferença entre rádio e televisão.

Mudança de Horário do Programa (00:07:16)
Discussão sobre a mudança de horário do programa e o impacto na audiência.

Experiências de Censura (00:09:41)
Relato sobre censura num programa de televisão, especialmente em relação à homossexualidade.

Fascículos Não Publicados (00:12:20)
História sobre fascículos encomendados pelo jornal “Expresso” que nunca foram publicados.

Reflexão sobre a Vida (00:13:39)
Júlio reflete sobre o envelhecimento e como as prioridades mudam ao longo do tempo.

Cuidado com a Manipulação (00:15:03)
Discussão sobre a capacidade de nos enganarmos a nós mesmos e a diferença entre responsabilidade e culpa.

Consultório e Trabalho (00:15:46)
Júlio fala sobre a sua rotina no consultório e o prazer que sente em continuar a atender.

Ritmo de Trabalho (00:16:56)
Reflexão sobre a escrita e a falta de tempo devido à rotina intensa de trabalho.

Agendas Complicadas (00:18:04)
Desafios de compatibilizar horários entre colegas para gravações e compromissos.

Visita Guiada à Agenda (00:19:07)
Comentário sobre a complexidade das agendas de trabalho e compromissos.

Reorganização de Trabalho (00:19:32)
Impacto das mudanças de horários na rotina de trabalho dos colegas.

Psicanálise e Trabalho (00:20:13)
Reflexão sobre a importância do trabalho e a dificuldade de imaginar não trabalhar.

Dia Típico no Consultório (00:21:09)
Descrição de como varia a rotina diária de atendimentos e a importância da escuta.

A Arte da Escuta (00:22:11)
Discussão sobre a escuta na psiquiatria e a necessidade de estar presente para os pacientes.

Desafios das Consultas (00:23:03)
Variedade das queixas dos pacientes e a experiência pessoal de Júlio com problemas psicológicos.

Aprendizado com a Depressão (00:24:11)
Júlio compartilha a sua experiência com a depressão e como isso influenciou o seu trabalho.

Importância da Psicanálise (00:25:01)
Reflexão sobre o papel da psicanálise na vida de Júlio e a gratidão ao seu psicanalista.

Silêncio na Terapia (00:25:50)
Discussão sobre a natureza do silêncio nas sessões de terapia e o seu significado.

Silêncios Confortantes (00:26:30)
Exploração dos diferentes tipos de silêncios e como eles podem ser reconfortantes.

Dificuldade em Expressar Sentimentos (00:26:51)
Júlio fala sobre a dificuldade dos pacientes em expressar as suas emoções durante a terapia.

Caminho Difícil da Terapia (00:27:30)
Reflexão sobre a escolha de enfrentar a dor em vez de optar por soluções mais fáceis.

A percepção da responsabilidade (28:07)
Discussão sobre como a percepção de ser vítima pode distorcer a realidade.

Reconstruindo a vida (29:38)
Reflexão sobre a importância de assumir responsabilidades e reconstruir a vida após dificuldades.

Lutos e padrões de comportamento (30:22)
Análise dos lutos emocionais e como moldam os nossos comportamentos e reações.

Aprendendo com os outros (31:07)
Exploração de como aprendemos a lidar com frustrações e desejos através das interações sociais.

Padrões infantis na vida adulta (32:30)
Discussão sobre como padrões de comportamento infantis podem persistir na vida adulta.

Mudanças ao longo da vida (34:04)
Reflexão sobre as mudanças que ocorrem com o tempo e a importância da experiência.

Relações e negociações (34:38)
Importância de negociar visões diferentes em relacionamentos para uma convivência saudável.

Paradigma da medicina (35:52)
Discussão sobre a evolução do paradigma médico, de curar doenças a cuidar de pessoas.

A complexidade da saúde (40:22)
Reflexão sobre a saúde ser uma questão complexa que vai além do tratamento de doenças.

A flexibilidade de género (00:42:17)
Discussão sobre as múltiplas configurações de género e a flexibilidade nas decisões.

Estereótipos de género (00:42:46)
Reflexão sobre estereótipos de homens e mulheres e as suas influências nas esferas pública e privada.

Mudanças na paternidade (00:43:47)
Mudanças nas relações entre pais e filhos, destacando a afetividade dos homens.

Evolução dos homens (00:44:23)
Os homens estão se afastando do estereótipo de força e bruta, explorando afetividade.

Vantagens emocionais (00:45:05)
Mudanças emocionais nos homens e como isso impacta as suas vidas.

Pressões sociais e feminismo (00:45:06)
Discussão sobre como as pressões sociais e o feminismo influenciam os homens.

Divisão de tarefas (00:46:46)
Reflexão sobre a divisão de tarefas domésticas entre casais e a semântica do “ajudar”.

Mudança de papéis (00:47:12)
A evolução dos papéis de género e a partilha de responsabilidades na casa.

Poder de influência feminino (00:49:11)
Discussão sobre o poder de influência das mulheres nas relações heterossexuais.

Relações não equitativas (00:50:06)
Análise das dinâmicas de poder nas relações, onde as mulheres influenciam indiretamente.

Inteligência artificial na medicina (00:50:32)
Reflexão sobre o impacto da inteligência artificial na prática médica e na relação com pacientes.

Utilidade da inteligência artificial (00:51:35)
A inteligência artificial pode melhorar diagnósticos e facilitar a comunicação entre médicos e pacientes.

Separação entre psicológico e físico (00:52:57)
Discussão sobre a discriminação da psiquiatria relativamente à medicina física.

Desafios da psiquiatria (00:54:02)
Preocupações sobre a prática psiquiátrica e a importância da comunicação com pacientes.

Facilitação do diálogo (00:54:58)
A inteligência artificial pode facilitar o diálogo entre médicos e pacientes, melhorando a experiência.

Preconceitos nos algoritmos (00:55:47)
Reflexão sobre como preconceitos humanos podem influenciar a programação de algoritmos.

Análise crítica dos algoritmos (00:56:18)
Discussão sobre a necessidade de considerar o viés dos algoritmos na saúde e na sociedade.

Manipulação do Algoritmo (00:57:02)
Discussão sobre como os algoritmos manipulam as nossas preferências e a diversidade de conteúdos disponíveis.

Inteligência Artificial na Medicina (00:58:27)
Referência à robótica na cirurgia e ao impacto da inteligência artificial na prática médica.

Confiabilidade das Máquinas (00:59:10)
Reflexão sobre a confiança nas máquinas e as suas falhas, especialmente em contextos éticos.

Falsidade Algorítmica (01:00:14)
Exemplo de como algoritmos podem criar conteúdos falsos que parecem verdadeiros, confundindo os utilizadores.

Empatia e Inteligência Artificial (01:02:06)
Discussão sobre a limitação da inteligência artificial em replicar empatia humana em situações emocionais.

Complementaridade entre Humanos e Algoritmos (01:04:08)
Afirmativa de que humanos e máquinas devem ser vistos como complementares, não concorrentes.

Limitações da Máquina (01:06:59)
Reflexão sobre a incapacidade das máquinas de experimentar emoções e a verdadeira empatia humana.

A Alma Humana na Comunicação (01:07:23)
A importância da experiência humana na compreensão e na comunicação, além da capacidade técnica das máquinas.

LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

JORGE C 00:00:12 Ora vivam! Bem vindos ao Pergunta Simples o vosso Podcasts sobre Comunicação. Nesta edição busco a escuta perfeita, não a escuta do som, do som perfeito, mas também é essa a escuta do outro, a escuta da outra pessoa. Busco essa afinação perfeita entre a fala e o silêncio, onde cada respiração pode descobrir a raiz de uma dor de alma ou de uma alegria intensa, e onde a empatia é o instrumento que abre espaço à confiança obrigatória para quem sofre poder falar, para quem ouve poder escutar. Um tal de Freud, Sigmund Freud inventou o sofá que fala, o sofá onde todos nos podemos deitar para falar connosco próprios, sabendo que há um psiquiatra, psicanalista ou psicólogo ali na cabeceira dessa cama existencial, para nos ajudar nessa caminhada por entre sintomas, dores, desejos e até ressurreições de alma. Nesta edição vou guiado pelo psiquiatra que conheci como ouvinte há mais de 30 anos, quando ficava colado à telefonia para ouvir o seu programa O Sexo dos Anjos, num roteiro que começou por ser uma ideia de programa para falar de sexualidade, mas que acabou, afinal, por ser um manual sobre a natureza humana.

JORGE C 00:01:38 Portanto, conheci o homem da rádio muito antes do psiquiatra e do professor de antropologia médica. Esta conversa poderia durar dez horas. Até poderia ser um diálogo em associação livre. Mas escrevi demasiadas perguntas para tantas respostas e o tempo não perdoa. É uma lição sobre como ouvir os outros, como praticar a arte da escuta e de como aceitar e compreender o outro como ele é. Falamos de diálogos, de palavras e de silêncios. Se gostarem, partilhem com os amigos e não se esqueçam de subscrever. É gratuito e fácil. Em pergunta simples como. Vive a professora? Olá! É muito fácil apresentá lo. Médico, psiquiatra, Professor de antropologia, Médica Humanista. Um influenciador até quarta influência.

JMV 00:02:27 Não, não, não sou. Eu ia sugerir uma coisa muito mais simples, que é dono da casa, dono da casa. Você está em minha casa. Obrigado por me receber em primeiro lugar, com todo prazer.

JORGE C 00:02:35 E é uma honra. Ainda por cima estávamos aqui a conversar um bocadinho que eu estava de de viagem vindo do Alto Minho, de Viana do Castelo, de Carreço e a primeira notícia do dia escreveu lá um livro.

JMV 00:02:50 Escrevi o primeiro livro, Sim, o primeiro livro O Sexo dos Anjos. Não totalmente, mas o porque O sexo dos anjos. Não estamos a falar de. Nós estamos a falar de uma coisa que tem 30 anos. Portanto, para muita pessoa que está a ouvir que não faz a mínima ideia do que eu estou a falar, que julho.

JORGE C 00:03:13 Era esse de há 30 anos.

JMV 00:03:14 Era o Júlio que fez com Aurélio Gomes, com José Zé Gabriel, o Sexo dos Anjos, de 89 a 95, se bem me lembro.

JORGE C 00:03:22 Na Rádio Nova, um programa mítico da rádio.

JMV 00:03:24 Portuguesa.

JORGE C 00:03:26 Onde se falava da Insustentável Leveza do Ser, do Milan Kundera.

JMV 00:03:29 Foi o primeiro livro que se falou e foi o livro que me marcou na realidade O início do Sexo dos Anjos. Porque o que o Aurélio me propôs o Aurélio tinha assistido a um dos meus cursos de sexualidade em Biomédicas. O Aurélio era era finalista de Psicologia e o qual me propôs foi um muito respeitável programa sobre educação sexual e eu gosto sempre de dizer que eu chegava lá e tentava o meu melhor para adormecer os ouvintes, porque dizia hoje vamos falar de determinada disfunção sexual.

JMV 00:04:05 O Aurélio punha se em automático oitavo para maturar. Fazia as perguntas certas, como é óbvio. Eu lá respondia E um dia o Aurélio devia estar já pelos cabelos e eu entrei para fazer o programa. E levava a insustentável leveza do ser debaixo do braço. E o Aurélio diz Anda a ler Kundera está a gostar. Eu disse estou. E aí começou o sexo antes. Nunca mais eu entrei com um tema de sexologia pura e dura e a partir daí era sobre os filmes, os livros, Associação Livre, Pronto.

JORGE C 00:04:42 A partir do Sexo dos Anjos a um psiquiatra antes do sexo dos anjos e um psiquiatra depois. Não.

JMV 00:04:49 Psiquiatra seguramente não. O que o sexo dos anjos contribuiu? Porque o Sexualidades teve uma quota parte de responsabilidade muito maior. E depois.

JORGE C 00:05:02 A televisão e a.

JMV 00:05:03 Televisão com o seu poder brutal. Isso aí nasceu o monstro do sexólogo, naquela altura uma espécie de sexólogo oficial do regime, digamos assim, o que teve pontos muito agradáveis. As pessoas trataram me trataram com extraordinária gentileza. Teve pontos desagradáveis, como por exemplo, o programa ser censurado.

JMV 00:05:23 Mas o que eu não estava preparado era para aquele tipo de choque mediático. Não sei se está de acordo comigo, mas a rádio é um clube de fãs e uma delícia. E a voz é o risco, porque é.

JORGE C 00:05:36 Uma família.

JMV 00:05:37 Sob muitos aspetos. Quando? Quando? Já está a ouvir rádio, ao fim de 10/2. Se o que ouve não lhe interessa, muda, vá se embora. Ou então não tem bom senso nenhum e é masoquista. Na televisão as pessoas podem distrair se com o décor. Como é que ele está vestido? Como é que aquela rapariga também está vestida e como é que eles estão em termos de idade, etc. Há uma data de motivos de distracção que na rádio não existem.

JORGE C 00:06:07 Mas há uma amplificação maior, porque agora, em termos.

JMV 00:06:09 De público.

JORGE C 00:06:10 Há liberdade de O que se pode dizer na telefonia, na rádio é diferente daquilo que se pode dizer na televisão. Comigo foi. Como é que foi? Como é que foi? Como é que foi esse episódio? Comigo foi.

JORGE C 00:06:21 Estamos na era hoje é que estamos mesmo na era do politicamente correcto. Onde? Onde? Uma palavra que um que seja colocada na casca de banana dá direito ao cancelamento, Dá direito quase a uma perseguição digital?

JMV 00:06:34 Sim. Bom, naquela altura, a perseguição digital seria uma expressão de ficção científica. Havia tecnologia, mas não aquilo que existe hoje. Mas deixe me dar um exemplo. Que eu me lembre, nunca houve um programa do sexo dos anjos censurado. Aliás, houve muitos programas de sexo dos anjos que foram feitos em directo, como diria Solar para Alice. É difícil censurar o Direito.

JORGE C 00:07:05 Está feito, está feito.

JMV 00:07:06 Está feito, Está feito. Porque o que acontecia era que eu vivia por cima da Rádio Nova.

JORGE C 00:07:11 Isso aqui é um luxo ou um desassossego? Depende. Se fizermos primeiro.

JMV 00:07:16 É um luxo. E de vez em quando. E houve duas fases. Primeiro, sexo dos anjos. Era só a noite? Era. E nós sempre achámos que era um programa noturno, digamos assim. Mas já lhe vou explicar como isso foi uma cura de humildade para nós.

JMV 00:07:33 E numa determinada altura e muito bem, a Rádio Nova disse Atenção, o programa vai passar também domingo à hora do almoço e nós ficámos para morrer, Dissemos. Mas os discos, nós passamos, aquilo de que falamos, etc. Aquilo é mesmo para os que estão pela noite fora, uns a estudar, outros no fim do dia de trabalho. Ainda por cima, se me permite mais nessa altura, uma demonstração. Eu gosto de acreditar que inconsciente de misoginia, porque o programa À hora do almoço disparou em audiência feminina.

JORGE C 00:08:07 Portanto, os homens ouviam mais. À noite, lá está, e havia muitas mulheres.

JMV 00:08:11 Mas à hora do almoço, meu caro amigo, democratizou se. Quem é que normalmente está na cozinha, não é? A pedalar naquela altura e hoje em dia, enfim, felizmente mitigado. Mas não desapareceu.

JORGE C 00:08:22 Não havia podcasts, portanto ouvia ou se ouvia em directo ou não se ouvia.

JMV 00:08:27 Havia pessoas que faziam o seguinte Gravavam, por exemplo, cassetes e mandavam para filhos, filhas, namoradas, etc.

JMV 00:08:35 Estavam a estudar em Inglaterra. Eu tenho cassetes dessas pessoas. Me entregaram achando que eu ia ter prazer nisso.

JORGE C 00:08:41 Tu queres ver que Júlio Machado Vaz é o homem que inventou o podcaster?

JMV 00:08:44 Não. Nem de perto nem de longe. Pronto e e portanto, nunca houve, que eu me lembre, censura no sexo dos anjos. Em contrapartida, na televisão houve pelo -1 uma situação em que. Misteriosamente, uma parte de um programa desapareceu. Como se tornar coincidência, era a parte em que o meu velho amigo Dr. Afonso Albuquerque estava a falar de homossexualidade e resolveu tirar da manga Das percentagens estimadas de homossexuais. Pronto. E disse qualquer coisa como 6%, 7% e tal. E então, como estava em associação livre, o que nós fazíamos todos foi por ali fora. Foi prolífero e disse Suponhamos, nós temos X deputados. Se isto fosse automático, tantos seriam homossexuais. Pronto, seria o programa Ponto Final parágrafo.

JORGE C 00:09:41 E o editor do programa começou a fazer contas. A vida começou.

JMV 00:09:43 Não sei quem foi porque oficialmente foi um acidente.

JMV 00:09:47 Um acidente muito circunscrito. Porque na semana seguinte o Afonso telefonou me furibundo e disse Eu não admito que me censurem. Eu não sabia o que é que ele estava a falar e fui perguntar. E então apareceu me uma vítima designada que disse que tinha cometido um erro e que logo aquela parte é que tinha saído. Pronto, isso é a primeira questão. Depois o Carlos Cruz teve a delicadeza de me dizer Olhe, há pessoas que acham que o Júlio fala demasiado da influência das instituições na área da sexualidade e menos de sexo puro e duro. Fala a vontade de sexo puro e duro, mas as instituições deixem em paz. Eu não me pesava na consciência ter dito fosse o que fosse, na minha opinião, de ofensivo. O que é facto é que depois eu fui buscar um episódio da Bíblia para ilustrar uma questão erótica e na semana seguinte tinha passado de um horário que eu nunca tinha pedido. Eu sempre pensei que o Sexualidades fosse um segundo canal, mas não. Estava no primeiro canal e passei das 23h00 no primeiro canal para 01h30 da manhã.

JMV 00:11:05 No segundo canal, um horário de filme pornográfico, alguma coisa assim.

JORGE C 00:11:08 Portanto, foi escondido.

JMV 00:11:09 Foi completamente escondido. Há muitas maneiras de censurar e isso foi pena. Foi pena porque nós, porque o programa não era feito só por mim e era feito com muito gozo. Nós recebíamos abaixo assinados de de, dos liceus, dos conselhos diretivos, etc, dizendo Nós gravávamos o programa e discutíamos aqui, mas agora nunca se sabe a que horas e no canal a horas terríveis, etc. E nós já tínhamos que explicar. Não somos nós que mandamos nisto, não é? E portanto, isso foi. Isso foi um segundo episódio. Mas há um episódio. Vou lhe dar. Vou lhe dar algo que penso que nunca disse em público. Um. Um jornal que eu sempre li, que continuo a ler quem sou, de qual sou subscrito ou que o Expresso um dia pediu para falar comigo e com uma enorme gentileza, perguntou me se eu não queria coordenar dez ou 12 fascículos sobre sexualidade. Eu fiquei um bocado atrapalhado que aquilo iria dar uma trabalheira desgraçada.

JMV 00:12:20 Eu tinha que ir pedir aos especialistas, não é porque eu não. Eu não gosto de assumir aquilo, aquele comportamento um bocado português que é, eu sei um bocadinho de tudo.

JORGE C 00:12:34 Portanto, fez de curador, fez de editor. E foi.

JMV 00:12:36 Fui à procura. Foi a sociedade portuguesa Sexologia Clínica, disse ao Gente. Propuseram nos isto. Isto é algo que nos honra. O Expresso e o Expresso.

JORGE C 00:12:47 Vamos à procura de temas. Vamos à procura de ocupar este espaço na agenda.

JMV 00:12:50 E fizemos isso. Deu muito trabalho. Fizemos 12 fascículos que foram entregues ao Expresso. O Expresso pagou religiosamente os 12 fascículos e cada um dos autores e os fascículos nunca foram publicados. Ficaram algures algures numa gaveta e é difícil de acreditar que um jornal encomende e pague qualquer coisa para depois não publicar. Portanto, alguém considerou que aquilo eventualmente poderia atentar contra a moralidade dos portugueses. Como é que.

JORGE C 00:13:25 Reage? Um psiquiatra perguntaria como é que se sentiu quando acontecem coisas dessas. Como é que o Júlio Machado Vaz. Gere as suas próprias neuras?

Speaker 3 00:13:37 Mau.

JMV 00:13:39 Muitas vezes é um ser humano como os outros. Eu espero bem que sim, mas não sei. Há uma velha história na psiquiatria que os psiquiatras encontram se e dizem tu estás bem e eu, Portanto, eu posso fazer esse jogo consigo também. Jorge está com bom aspeto, Está bem, É ou não é? Mas aí eu devo lhe dizer eu não sou. Há um amigo meu que diz Pois se não fosse a morte estar mais perto, eu só via vantagens Eu não sou um pessimista quanto ao envelhecimento e o envelhecimento nisso ajudou muito. Tranquiliza Sim.

JORGE C 00:14:16 Pacificou.

JMV 00:14:17 Muito. Há coisas que que me poriam e que me puseram a trepar pelas paredes há 20 ou 30 anos atrás e que hoje em dia me fariam sorrir e seguir em frente.

JORGE C 00:14:27 Relativizar e deixar andar.

JMV 00:14:28 Sim, porque nós reorganizamos as nossas prioridades.

JORGE C 00:14:33 Mesmo quando desfeita.

JMV 00:14:35 Isso foi mais complicado porque eu andei a pedir desculpa a cada um dos autores por quem os tinha desencaminhado para trabalhar e trabalhar. Forte tinha sido eu. Portanto, eu sentia me responsável.

JORGE C 00:14:48 E quando e quando? Quando se sente responsável por por alguma coisa essa esse ato de contrição, de pedir desculpa é uma coisa que acontece normalmente ou há coisas que precisa de passar tempo para perceber?

JMV 00:15:03 Cuidado porque nós somos muito capazes de nos manipularmos a nós mesmos de uma forma magistral.

JORGE C 00:15:10 Somos, somos cegos ou fazêmo lo mesmo de uma forma deliberada.

JMV 00:15:14 Deliberada, muitas vezes inconsciente ou de uma forma deliberada. E, portanto, eu não posso garantir que não haja situações em que, eu não me engano, a mim mesmo para me desculpabilizar. A única coisa que eu posso ser é assim se eu chego à conclusão que porque repara, há uma diferença entre palavras. Por exemplo, uma coisa é responsabilidade, outra coisa é culpa. Eu não tinha culpa nenhuma naquilo, mas eu tinha pedido às pessoas para colaborarem e elas tinham dado duro. E, portanto, eu senti me na obrigação de lhes pedir desculpa. E verdade.

JORGE C 00:15:46 Vamos viajar até ao consultório? Ainda continua a ouvir pessoas?

JMV 00:15:50 Continue. Quatro dias por semana.

JORGE C 00:15:53 Isso não é ritmo para alguém que podia estar agora, se calhar a pensar escrever mais livros, fazer mais. Isto é uma escravidão.

JMV 00:16:02 Isto parece uma cabala? Não é? Porque, como sabe, é para meu grande prazer, porque o apresentei aqui no Porto, o Luís Osório escreveu o livro sobre o Manoelzinho, o terrível professor Manuel Sobrinho Simões, e houve alguns movimentos no sentido de a seguir avançar. Eu e os que vêm. Não, não me estava a apetecer aquele tipo de formato. Não é impossível que eu volte a escrever. Mas tem razão, eu tenho pouco tempo. Se calhar também não tenho tanta motivação como isso. Mas eu tenho 74 ou 75, faz quatro dias de consultório por semana e um dia de rádio porque gravo dois programas O amor é e o outro frente é mesmo para falarem. Se bem me lembro. Doutor Almeida Santos, gostava de citar essa frase, que é um bom improviso. Dá muito trabalho a preparar.

JORGE C 00:16:56 Portanto, há que pensar, há que escrever umas notas a cada coisa.

JMV 00:16:59 O Tiago, o Miguel, mandou um mail e dizem me a mim e ao Manuel vocês gostariam de falar disto ou daquilo? Manuel, diz lá isto nem pensar. Ou eu digo isto não sei nada que é uma óptima razão para não falar. Depois é preciso chegar a um acordo e nessa altura é preciso ir para os artigos, para os jornais, etc. O amor e o amor é muito mais descontraído. É bom não esquecer que o amor tem 20 anos entre o António e entra na mesquita e entre Mademoiselle e Inês. Estamos em 20 anos e portanto aí a coisa é muito mais simples. Quer dizer, e é imprevisível, Imprevisível porque um de nós lê qualquer coisa que lhe interessa, manda o mail ao outro e diz. se falássemos disto. E a maior parte das vezes o outro diz sem problemas. Outras vezes o que acontece é se convidássemos a alguém. A maior parte das vezes não há nenhum problema quanto ao tipo de convidado, Portanto, o amor. E nesse sentido, também somos dois que se conhecem a uma data de tempo.

JMV 00:18:04 É verdade que eu conheço o Manuel, vai para 50 anos, mas somos quatro, porque para nós, para mim e para o Manuel, o Tiago e o Miguel fazem parte do Alfredo.

JORGE C 00:18:16 E portanto é mais difícil. Portanto.

JMV 00:18:18 Há sempre mais uma ideia. Mas depois há uma coisa terrível no olho de frente que é compatibilizar as agendas de quatro. Enquanto eu e a Inês é religioso.

JORGE C 00:18:31 Para que eles já tenham 01h00, já tenham um dia de.

JMV 00:18:33 Feira àquela hora tal, se houver. De vez em quando há uma impossibilidade e o outro avisa com uma semana de antecedência e adianta se 01h00. Bom, o Old Friends é o caos absoluto. Nós já gravámos a noite porque não havia outra hipótese. Pronto.

JORGE C 00:18:47 Então as agendas estão assim tão complicadas?

JMV 00:18:52 Ouça, se tiver preguiça de ir para a selva amazónica e portanto lhe apetecer qualquer coisa de mais prosaico, próximo e fácil, eu levo. Numa visita guiada à agenda do Professor Sobrinho Simões.

JORGE C 00:19:07 É caótica.

JMV 00:19:07 É o caos.

JORGE C 00:19:08 Eu sei que se tem que mandar lhe um e-mail.

JORGE C 00:19:10 Depois ele responde Está a planear a sua vida lá para para Junho do próximo ano ou para Setembro do próximo ano.

JMV 00:19:15 Tudo não é pronto. A minha é um bocado melhor, mas também não é propriamente famosa. E depois nós temos dois profissionais da área que é o Tiago e o Miguel. Veja, por exemplo basta o Miguel passar dos noticiários da manhã para a tarde e já.

JORGE C 00:19:31 Lá foi um bloco.

JMV 00:19:32 Isto é uma reorganização total porque o desgraçado levantou se às cinco e tal da manhã ou às seis e portanto chegou uma altura que até um certo momento está a trabalhar. A partir daí, coitado, passa. O exagero está quase em coma. Portanto, é preciso levar essas coisas também em conta. O que é que diria um.

JORGE C 00:19:50 Psicanalista de duas pessoas? Eu sei, eu sei. Mas um Freud desta vida que, olhando para a agenda de duas pessoas ou de uma pessoa que está aqui à minha frente, estabelecida, que já fez, já fez muito na vida, que ainda precisa de ter uma agenda tão, tão complicada, em vez de fugir, lá para, para para canto, lanche lá para o sítio onde estão.

JMV 00:20:13 Sexta feira já lá estarei. E se é curioso, sabe porque? Por exemplo, este ano o meu curso fez 50 anos e, portanto houve as adequadas e inevitáveis festividades aqui no Porto, aqui no Porto, E houve vários colegas meus que me disseram tu ainda trabalhas? E eu fiquei varado com a pergunta porque para mim é muito complicado. E aí o Manuel é igual a mim ou pior? Para mim é muito complicado imaginar, mas não trabalhar. Significa isto que a minha música e os meus livros não me ocupariam horas de puro deleite, seguramente.

JORGE C 00:20:53 Eu sei, é uma necessidade ou é uma pré programação?

JMV 00:20:57 E a outra coisa é que eu ainda tenho prazer em trabalhar, porque aquilo que eu faço, sobretudo psicoterapia, eu não consigo imaginar a ser feita como uma obrigação.

JORGE C 00:21:09 Como é que é um dia típico de não sei.

JMV 00:21:11 Aí varia a.

JORGE C 00:21:12 Hora. A hora das pessoas ainda têm 50 minutos.

JMV 00:21:16 À hora dos system, de 45 e 01h00. Pronto. Mas por exemplo, a que horas isso varia? Eu gosto de funcionar de manhã de maneira a meio da tarde estar livre.

JMV 00:21:28 Tenho colegas meus que é exatamente o oposto. Isso também tem a ver com a organização dos dias, não é? Mas há uma coisa que sempre me aconteceu, mas agora me acontece de uma forma mais premente, diria eu, que é a minha profissão antes de tudo o resto é ouvir.

JORGE C 00:21:50 Como é que se ouvem pessoas.

JMV 00:21:53 Ainda estou a aprender. Acho que sei mais do que sabia há 40 anos.

JORGE C 00:21:58 Mas deve haver uma estética. Sim ou não? O Livro Secreto de Júlio Machado Vaz, como a arte, a arte da pergunta ou até a arte da pergunta.

JMV 00:22:08 Não estou a falar da escuta. A arte.

JORGE C 00:22:09 Da escuta. Pois é.

JMV 00:22:11 Pois é. É curioso que no sexo dos anjos eu escrevi que que a vida e a psiquiatria, que são a arte a distância, é e continua a acreditar nisso. Por que é que eu lhe disse que aqui há uma variação? Porque eu sempre fui assim. Mas hoje, como seria lógico, isso tornou se mais evidente. Eu não consigo fazer mais que seis consultas seguidas depois.

JORGE C 00:22:39 Só que é um cansaço.

JMV 00:22:40 E um cansaço e eu posso estar lá, mas não estou.

JORGE C 00:22:45 Não está disponível.

JMV 00:22:46 Estou disponível para a escuta, como acho que tenho a obrigação de estar. Aquelas pessoas foram em busca de ajuda. Por que é que eu estou a dizer? No fundo, cada um é como é. Eu tenho colegas meus que são capazes de fazer dez ou 12 consultas, mas cada um de nós é diferente.

JORGE C 00:23:03 E essas consultas normalmente são consultas regulares. As pessoas voltam ao fim de algum tempo e faz se um trabalho ao longo deste tempo.

JMV 00:23:09 Sim, sim, o que varia muito a pessoas com uma vez por mês. Há pessoas que vão de 15 em 15 dias. O que é que.

JORGE C 00:23:15 As pessoas se queixam?

JMV 00:23:17 Olhe, primeiro um ponto de ordem que é Eu não faço psiquiatria pesada, leia se as psicoses, etc. Portanto, grande parte das vezes eu estou a falar com pessoas que se vão queixar, entre aspas, de maleitas psicológicas, muitas das quais eu já passei por elas.

JMV 00:23:38 Por exemplo.

JORGE C 00:23:39 Isso é importante para ter sentido na pele.

JMV 00:23:42 Eu preferia não ter passado.

JORGE C 00:23:44 Mas já lá está.

JMV 00:23:45 Passei. Tenho que admitir que as vezes, não poucas, foi uma vantagem, nomeadamente o facto de eu ter passado por uma depressão. O meu bom amigo Carlos Amaral Dias dizia Eu aprendi muito com o meu AVC, mas dispensava bem. Eu cito isso para a minha depressão. Eu aprendi muito tendo estado deprimido, mas tinha dispensado a minha depressão.

JORGE C 00:24:11 Durou quanto tempo Esse?

JMV 00:24:13 Estive bastante em baixo. Cerca de três anos.

JORGE C 00:24:17 Três anos. Sim.

JMV 00:24:19 À volta dos 30.

JORGE C 00:24:21 Que é que é um tempo?

JMV 00:24:22 Isto foi a altura em que fui para o divã por necessidade. Não é porque às vezes, naquela altura, hoje em dia creio que já não. Mas naquela altura havia alguns de nós. Todos nós temos o nosso narcisismo. E alguns de nós iam para o divã, mas não diziam que precisavam. Diziam que iam para aprender.

JORGE C 00:24:40 Era um charme. Ficava bem, ficava bem.

JMV 00:24:43 Aliás, a psicanálise nessa altura.

JMV 00:24:46 Estou disponível para que discordem de mim. Eu acho que a psicanálise, nessa altura, tinha muito mais poder em Portugal do que tem hoje e, portanto, ser psicanálise podia contar até no futuro profissional das pessoas. Eu não. Eu disse sempre a toda a gente. Eu fui para lá porque precisava.

JORGE C 00:25:01 A mim dói me e, portanto, estou.

JMV 00:25:03 Num oito, não é? Aliás, como o meu patrão da altura, o Eurico Figueiredo disse sempre fizeste muito bem, foste para lá a quatro e saíste lá. Pelo menos a três já foi melhor. E, portanto, eu nunca deixo de expressar a minha gratidão pelo Dr. José Milheiro, que é um bom amigo hoje em dia. Faz parte da nossa da nossa tertúlia na Ordem dos Médicos, com o Professor Sobrinho Simões, com o Dr. António Lopes, etc. E que foi o meu psicanalista.

JORGE C 00:25:33 O que há tanto para dizer durante durante semanas ou meses de de conversa, Ações.

JMV 00:25:40 Em que há um silêncio absoluto e eu garanto lhe que os psicanalistas não são muito useiros e vezeiros de interromper o silêncio.

JORGE C 00:25:50 Deixa estar.

JMV 00:25:51 Deixa que estão atrás de nós. É uma profunda solidão e uma profunda solidão.

JORGE C 00:25:57 Portanto, estamos deitados?

JMV 00:25:58 Estamos, sim. E a cura, tipo de.

JORGE C 00:26:00 Freud, está aqui. Ele está aqui, nas nossas costas.

JMV 00:26:03 Pronto.

JORGE C 00:26:05 O silêncio não dói às pessoas.

JMV 00:26:06 Quando o silêncio se quiser. E é das coisas mais fascinantes na minha profissão e na vida em geral. Porque há todo o tipo de silêncios. Há silêncios que são angustiantes, muito mais angustiantes. Qualquer palavra. E, por outro lado, há silêncios que têm o conforto que nenhuma palavra pode dar.

JORGE C 00:26:30 Pode ser um silêncio com os nossos amigos mais próximos. É só um silêncio bom, não é?

JMV 00:26:33 Tem a sensação que tudo está certo. Não são precisas palavras sequer.

JORGE C 00:26:39 É outro silêncio. É o silêncio de eu não sei o que é que hei de dizer mais a esta pessoa que aqui está. Eu até podia dizer qualquer coisa, mas estou aqui a falar do terapeuta. Não, não, não estou a falar do desgraçado que está no divã.

JMV 00:26:51 O desgraçado que está no divã muitas vezes tem dificuldade até em expressar aquilo que sente. Basta dizer lhe isto. Quando eu fui para psicanálise ao fim de três meses. Eu lembro me de comentar. Com amigos, com a minha ex mulher, etc. De comentar e dizer assim Mas isto é um masoquismo, isto é caro Eu estou lá há três meses e estou pior do que quando entrei, o que era verdade. E estava pior porque.

JORGE C 00:27:30 Estava a mexer na dor.

JMV 00:27:31 Estava a mexer em coisas que para mim estavam arrumadas da forma como convinha, o que o Jorge já cá estava a chamar a atenção. Ou seja, eu fui para o divã e eu reconhecia que precisava fazer qualquer coisa. Podia não ter feito aquilo. Podia ter recorrido só a antidepressivos e não ter feito psicoterapia nenhum. Pronto, eu decidi que ia para o caminho mais difícil. Não estou a dizer sequer isso, mas eu. Eu precisava de entender e pensava não tenho nada contra as pastilhas. Se melhorarem, óptimo. Mas isso não basta.

JMV 00:28:07 Eu tenho que entender o que se está a passar comigo. Pronto. E fui. Mas fui e não sou o único com uma perspetiva do que estava a acontecer na minha vida, que era assim. Os astros estão alinhados contra mim. Há muitas pessoas que cujo divertimento é fazer a minha vida no inferno. Eu sou um tipo azarado por ser uma vítima.

JORGE C 00:28:35 Estão me a lixar a minha vida e eu sou a vítima inocente que aqui está, que não tenho nenhuma quota parte de nenhuma responsabilidade nesta conversa.

JMV 00:28:44 Ao fim de três meses eu tinha percebido que não estou a dizer que a minha volta fosse em todos os Santos. Não estou a dizer que não tivesse havido aqui e acolá um passo em falso, sem responsabilidade nenhuma, mas que basicamente eu tinha metido num poço pelo meu pé e dentro do poço ainda tinha mergulhado na água, ainda estava mais fundo. O que é irritante que é? Você está a tentar sentir se melhor, Pelo contrário, está se a sentir pior. Aquilo é caro. Você pelo menos tenta rir se quando diz à sua mulher nessa altura.

JMV 00:29:23 Não, nós ao fim de semana, agora só podemos ir à tasquinhas, que não há dinheiro para restaurantes bons, etc. Uma pessoa diz Mas o que é isto?

JORGE C 00:29:31 Porque é que alguém se submete a esse aqui em.

JMV 00:29:34 Vez de ir embora?

JORGE C 00:29:35 Sofrimento inútil? Aparentemente não é.

JMV 00:29:37 Não foi.

JORGE C 00:29:38 Inútil.

JMV 00:29:38 Não foi, Não foi. Porque depois eu comecei a ir ao osso e a começar a falar verdadeiramente de coisas, algumas das quais eu nem sequer pressentia. E a pouco e pouco eu fui voltando à superfície.

JORGE C 00:29:54 Mas isso parece me uma espécie de arqueologia da nossa mente, da maneira como.

JMV 00:29:59 Não quero ser injusto, porque aplicar a palavra arqueologia pode reenviar nos para uma visão da psicanálise. De tudo isto tem a ver com a infância e ficamos completamente marcados e depois não acontece e não tem importância. Não é.

JORGE C 00:30:14 Assim. Nós estamos sempre a reconstruir nos e a ver o que é que, como é que estamos, como é que nos sentimos, como é que, sei lá.

JMV 00:30:21 Vou lhe dar um exemplo.

JMV 00:30:22 A vida, inevitavelmente, é um trajeto cheio de lutos, de lutos, de gente que morre e de lutos que gente que não morre. O que não quer dizer que sejam muito mais fáceis. Às vezes são até mais difíceis.

JORGE C 00:30:35 Pessoas que nós perdemos emocionalmente, gente que.

JMV 00:30:38 Perdemos, que nos desiludiu ou a quem nós desiludimos. Amizades que se desfazem, etc. E tudo isso são lutos. Depois, as dificuldades normais da nossa vida, que não é propriamente simples. E isso significa que muitas vezes nós descobrimos que temos padrões de comportamento para lidar com a frustração, para lidar com o desejo, etc.

JORGE C 00:31:07 Aprendemos isso onde? Onde é que aprendemos.

JMV 00:31:10 Isso Com os outros? Com a maneira como crescemos? Como vimos os outros funcionar? Aprendemos isso com os nossos próprios comportamentos, que às vezes, quando éramos putos, permitam a expressão, eram maneiras adequadas de reagir. Mas não. Aos 20 e tal, aos 30 e tal.

JORGE C 00:31:27 Anos, voltamos à infância e lá está.

JMV 00:31:29 Não é voltar sequer. Às vezes é manter padrões de comportamento que na criança são mecanismos de defesa, quais? Inevitáveis.

JMV 00:31:39 A criança vive numa floresta de joelhos e nós somos assim. E a criança está aqui. E a criança tem as suas teorias quanto ao que acontece e que acontece. A criança tem uma intuição brutal. A criança não sabe muitas vezes o que está a acontecer, mas sabe. Muitas vezes antes de nós lemos que as coisas não estão bem e tem de se adaptar e manipula. O meu querido amigo Octávio Cunha dizia aos pais quando eles apareciam com com os bebés Agora apareceu lá em vossa casa o maior manipulador da história. E é verdade, as crianças têm as suas armas também e de vez em quando isto de uma forma simplista, quero deixar bem claro. De vez em quando nós descobrimos, já adultos, que temos formas de funcionar, que são formas infantis.

JORGE C 00:32:30 E que não é, que não ultrapassamos e que não.

JMV 00:32:32 Funcionam. Depois já não funcionam, já não funcionam e que nós ficamos muito frustrados com aquilo. E a maneira mais simples é, consciente ou inconscientemente, culpar os outros, culpar o. O boletim meteorológico para o que quiser, não é? Portanto, em mim, o facto de, numa determinada altura, de uma forma simbólica, naquele naquele divã, com aquele quadro que eu nunca esquecerei à frente que.

JORGE C 00:32:57 Estava lá à.

JMV 00:32:57 Frente. Mas fazer daquele quadro um espelho e dizer mas espera aí, Julho, a que coisas? Que foste tu que escolheste? E, portanto, tens que assumir a responsabilidade e tens que mudar comportamentos, porque se continuares com o mesmo tipo de comportamentos, os resultados vão ser os mesmos. Nós temos essa nostalgia, não é? Eu faço as mesmas coisas, mas o resultado vai ser diferente, mas não vai.

JORGE C 00:33:24 Mas as pessoas mudam intrinsecamente. As pessoas.

JMV 00:33:28 Mudam. Não é fácil. Agora há mudanças e mudanças, sei lá. Há bocado eu disse lhe e isso foi, penso eu, qualquer coisa de que foi acontecendo. Eu estava lhe a dizer há 20 ou 30 anos havia coisas que para mim podiam ter muito importância e que hoje, pronto, eu não lembraria no dia seguinte. Isso é um tipo de mudança, tem a ver com o decorrer da vida com nós. Desejavelmente, isto pode ser como é que se diz wishfull thinking, não é? Mas nós adquirirmos alguma sageza, etc.

JMV 00:34:04 Experiência, experiência, outras vezes mudamos de outras formas. Supõe uma relação, uma relação. A palavra não é muito agradável de empregar, mas uma relação que se projeta no futuro. E eu não gosto nada de certas vozes que dizem Ah, não! Hoje em dia isto é tudo terrivelmente superficial. E hoje, uma pessoa, amanhã ou outra e tal, não é isso que eu encontro no consultório.

JORGE C 00:34:32 Portanto, há pessoas.

JMV 00:34:33 Que pessoas continuam com a nostalgia que as relações de incerto.

JORGE C 00:34:37 E investem nisso.

JMV 00:34:38 E investem nisso. Mas muitas vezes nós temos que assumir que uma relação que ainda por cima se projeta no futuro é uma negociação permanente.

JORGE C 00:34:48 E que há visões diferentes daquilo o caminho.

JMV 00:34:51 Se há visões diferentes, é preciso ser negociado um caminho. Se quisermos voltar à matemática, que seja uma bissetriz. Ou então aquela relação rígida e fica. E há alguém que domina a relação e alguém quer dominar. Não é uma boa ideia. Normalmente porque relações rígidas quando quebram, quebram mesmo.

JORGE C 00:35:15 Entre as outras. De outro lado, que são tão competitivas que que que que podem estar.

JORGE C 00:35:20 Eu estou a falar.

JMV 00:35:21 Das outras que são adaptáveis.

JORGE C 00:35:22 Às adaptáveis.

JMV 00:35:23 Sim, Em que, por exemplo, Veja, nós estamos. Isto é muito importante para a medicina. A medicina viveu, e bem, um paradigma que era o paradigma das doenças infecciosas, ou seja, aparecia uma doença. Nós identificávamos nós um psiquiatra, a dizer isto, como compreende? Nós identificávamos o bichinho, escolhíamos a droga que matava o bichinho, a droga matava o bichinho, os sintomas desapareciam.

JORGE C 00:35:52 Ou então o bicho era demasiado forte e o bichinho matava o.

JMV 00:35:55 Íamos nós. Pronto, isso acontece ainda. Mas pronto, os antibióticos são um exemplo típico disso. Hoje, com o aumento de longevidade, nós estamos num paradigma que não substitui este. Tivemos uma cura de humildade com.

JORGE C 00:36:13 A pandemia, o pequeno vírus que nos deu cabo da vida durante dois anos, pelo menos.

JMV 00:36:18 Mas é uma sociedade que acima de tudo, tem vindo a deparar se com as doenças crónicas. Aquilo que o povo. Quando eu fazia consulta em Matosinhos e em Gaia, recém formado, me dizia ao sôtor estas só com banhos, terra fria ou não matam mas moem.

JMV 00:36:39 É exactamente isso. São doenças crónicas. As dores.

JORGE C 00:36:41 Nas cruzes, essas coisas.

JMV 00:36:42 Todas que são ainda por cima.

JORGE C 00:36:45 As maleitas da.

JMV 00:36:46 Idade, as maleitas da idade que são ainda por cima muito ameaçadoras para o narcisismo do técnico de saúde, porque ele tapa um buraco ali e no mês seguinte a pessoa vem a queixar se outra coisa e a pessoa de repente diz mas eu não consigo verdadeiramente decorar, Pois não é isto. É o paradigma do cuidar.

JORGE C 00:37:07 Mas isso é uma ilusão dos médicos acharem que conseguem curar tudo e salvar toda a gente a todo o momento. Ou não?

JMV 00:37:15 Até certo ponto sim. E digo lhe isso com pena. E sabe porquê? Estão ali já de responsabilidades, porque eu próprio fui professor.

JORGE C 00:37:24 De antropologia médica. Não é tentar perceber como é que os médicos se fizeram ao longo da história do tempo.

JMV 00:37:28 É que a formação dos médicos foi sempre muito feita no paradigma do curar.

JORGE C 00:37:36 Eu vou lá, eu intervenho, eu resgato.

JMV 00:37:39 O que às vezes transformava o o corpo e a mente também, mas sobretudo o corpo do doente num campo de batalha entre os médicos e a morte ou deformidade, ou fosse o que fosse.

JMV 00:37:58 E aqui esquece quais a pessoa.

JORGE C 00:38:01 Fazendo tudo o que há para fazer e.

JMV 00:38:02 Nós, os médicos e a medicina não luta contra a doença. A medicina debruça se sobre uma pessoa que está doente. Isto pode parecer sinónimo, mas não é verdade, porque, por exemplo, nenhum de nós está doente da mesma maneira, com a mesma doença.

JORGE C 00:38:19 Portanto, não é a doença e a pessoa que está.

JMV 00:38:22 Doente, ou seja, a doença X. Se nós pensarmos nela como aprendemos nos velhos calhamaços, corremos o risco de nos metermos num beco sem saída. Que é se a doença é aquela extrema chamada visão essencialista, se é sempre aquela. O tratamento é sempre o mesmo.

JORGE C 00:38:45 Então não é preciso. O médico também quase não é. O problema é.

JMV 00:38:47 Que os doentes são todos diferentes.

JORGE C 00:38:49 Têm sensações diferentes, têm vidas diferentes, têm corpos diferentes, tudo.

JMV 00:38:54 E nós tratamos. E pessoas não é doença.

JORGE C 00:38:56 Então e como é que e como é que os médicos lidam então com essa coisa que é tentar fazer tudo a todo o momento, a toda a hora, com todas as armas, incluindo as nucleares, para tentar salvar aquela pessoa desde logo.

JMV 00:39:10 E isso é importante para nós, médicos, na formação dos médicos, porque no passado essa noção não era inculcada nos jovens médicos. Desde logo, estamos a falar de profissionais de saúde e não apenas médicos. Vamos falar de trabalho, de equipa.

JORGE C 00:39:27 Há uma equipa.

JMV 00:39:27 Pronto, mas isso não é linear. Muitas vezes. Os médicos foram formados, por exemplo, para trabalhar em equipa, com uma condição que é também trabalhamos em equipa, mas o chefe de equipa sou eu. Bom, mas é que há muitas situações em que aquilo que se nos depara é melhor que quem lidera a equipa. Não seja um médico e.

JORGE C 00:39:53 Seja um enfermeiro até, quiçá um assistente social, o que for.

JMV 00:39:56 Pois a prescrição social que é um exemplo típico. Jorge trabalha numa área em que aparecem não sei quantos idosos com doenças pulmonares. Jorge conhece o sítio onde eles moram? Sim, e a umidade escorre pelas paredes. Jorge pensa assim Eu aceito o antibiótico, mas não resolve nada.

JORGE C 00:40:20 A questão está na casa. A questão está nas questões sociais.

JMV 00:40:22 Claro. Ou seja, aqui a saúde, qual, aliás, como Organização Mundial de Saúde, está sempre a repetir. A saúde não é demasiado importante e é A urgência mundial de saúde. Pede nos falem mais da saúde e menos da doença. A saúde é demasiado importante e demasiado complexa para ser deixada nas mãos do Ministério da Saúde. Tem que ser muito mais gente a tratar das coisas. Isso é importante. Mas voltando lá atrás, depois queixa se de mim. Estava eu a falar da relação, o cuidar na relação, numa relação maleável. Suponhamos que alguém tem um período mais em baixo, o outro assume um estatuto de mais cuidador e na semana seguinte ou no mês seguinte, invertem se as posições. Este tipo de relação é muitíssimo mais resistente a todos os traumatismos da vida quotidiana do que uma que é perfeitamente rígida.

JORGE C 00:41:18 E porque é que não é sempre assim, com essa flexibilidade, com essa maleabilidade?

JMV 00:41:22 Porque nós humanos, somos animais, digamos assim. O Manoel diria imediatamente porque nós somos rascas. Ou seja, por exemplo, com muita frequência mesmo de uma forma inconsciente, se numa relação uma pessoa tem uma um ascendente sobre o outro, tem no fundo poder sobre o outro.

JMV 00:41:51 Não abre mão desse poder com facilidade. Ora esta! Este equilíbrio pressupõe. Vou empregar o termo sem nenhuma conotação psiquiátrica, como os meus netos o enxergariam. Não pode haver paranóias de adormecer, dominar ou dominar. Na relação, em princípio, devemos estar ombro a ombro, duas liberdades e olhar no mesmo sentido.

JORGE C 00:42:17 Curiosamente, depois. Quer dizer, não quero colocar isto no binário homem e mulher, porque sabemos que o mundo agora tem múltiplas configurações e há formas diferentes, lá está, de exercer essa tal flexibilidade ou inflexibilidade. Conforme. Sim, desde de uma forma mais classicamente masculina de tomar decisões, de ir para a frente. É uma fórmula mais feminina. De uma maneira que é eu vou levar a minha água ao seu moinho e vou arranjar maneira de que isto chegue lá da mesma maneira.

JMV 00:42:46 Permita me que pegue exactamente na sua imagem, não só por preguiça minha que é lendária, mas porque a imagem é magnífica. Repare nisto. Isso é o estereótipo em que não estou a dizer que o Jorge é da minha idade.

JORGE C 00:43:01 Vou ser crucificado?

JMV 00:43:02 Não, não. Mas a minha geração foi toda educada nesse estereótipo. Os homens são mais activos, mais racionais, mais isso, mas aquilo. Estão sobretudo na esfera pública. As mulheres são mais sensíveis, mais amorosas, melhores cuidadoras e estão na esfera privada. Quer se queira quer não, isto é meter as pessoas, neste caso os dois sexos, se quiser. Depois vamos à questão do binário não binário. Estamos a meter o sexo em gavetas, ou seja, a limitá los. Tem toda a razão. Vou lhe dar um exemplo. Veja o que mudaram os homens. Mesmo assim alguém poderá dizer não tanto como seria desejável, mas mudaram na sua relação. Agora até vamos tirar a questão de do casal heterossexual e falar nos filhos. A relação hoje em dia do pai do homem é infinitamente mais próxima. Em geral, com todas as exceções que ambos conhecemos, do que há 30, 40, 50 anos atrás. E nós podemos dizer assim ainda bem para os miúdos. E temos razão, mas também ainda bem para os pais, porque estes homens descobriram em si dimensões de afectividade que antes lhes eram praticamente proibidas.

JMV 00:44:23 Quer dizer, nós éramos educados para ser cópias rascas do John Wayne, Fortes e Brutos, não é? O João não é, não, dizia 1A1 das heroínas que amava. Ela adivinhava que ele a amava e, portanto, no fim, ela punha um prato na mesa e ele, sem dizer nada, ficava, aparecia dizendo. E a malta percebia que eles iam casar, mas ele não tinha aberto o bico. Então os homens eram.

JORGE C 00:44:51 Assim apesar de tudo. Então coitados, coitada da nossa espécie e dos homens que têm que fazer aqui um aqui, um caminho, e que esse caminho também não é ornamento?

JMV 00:45:01 Sim, sim, mas os homens mudaram, mas mudaram com vantagens para eles agora.

JORGE C 00:45:05 Vantagens emocionais também.

JMV 00:45:06 Mentais. Emocionais. Agora, não sejamos, não sejamos líricos na questão do poder, muito do mundo masculino só mudou pela pressão que veio. E agora o cuidado de parte do mundo feminino, porque os feminismos não esgotavam o universo feminino. Havia mulheres que muitas vezes tinham ataques. Estou a falar de coisas verbais e escritas, etc.

JMV 00:45:37 Muito mais furibundos as feministas que os próprios homens que eram mulheres, a quem o patriarcado puro e duro convinha.

JORGE C 00:45:46 Lá estava o padrão.

JMV 00:45:47 Pronto estava o padrão. Agora, o que é que você verifica hoje em dia? Verifica, por exemplo, nas nas tarefas. Mas ele fica sempre zangado comigo por dizer isto. Mas pronto, é assim. Tenho muita pena, mas só o meu filho mais velho quer casar, por isso o meu filho mais velho é casado e eu vi o sempre. Agora repare no verbo que eu vou utilizar e ouvi o sempre partilhar todas as tarefas de casa com a minha nora. Nem ela admitiria outra coisa. E eu nunca fiz isso. E eu digo partilhar. E isto diverte me sempre muito, porque nós, homens em geral, sobretudo os da minha geração, ficamos maravilhados com outro verbo que é ajudar. Quando nós dizemos eu ajudo. Só falta darmos uma volta ao estádio e receber os aplausos. E algumas mulheres. E eu compreendo. Ajudam nos nisso porque dizem ah, ele ajuda muito lá em casa.

JMV 00:46:46 Eu compreendo, Não tem mal nenhum. É semântica, mas traduz outra coisa. Nós, em teoria, não devíamos ajudar.

JORGE C 00:46:53 Não é equitativo.

JMV 00:46:53 Não é a casa, não é dos dois, os filhos não são dos dois. Então devia se partilhar tarefas, não era?

JORGE C 00:46:59 Posso fazer uma declaração machista.

JMV 00:47:01 À vontade.

JORGE C 00:47:02 Quando nasce a criancinha, a mamã agarra a criancinha e diz Calma, que isto aqui agora sou eu, que pelo menos nos primeiros dias, nos primeiros tempos, a minha criancinha sim.

JMV 00:47:12 Mas quer dizer, não.

JORGE C 00:47:14 Vamos ajudar a dar o banho.

JMV 00:47:15 Mas claro está, mas queremos dar o banho, mudar fralda.

JORGE C 00:47:20 Incompetente para fazer isto.

JMV 00:47:21 Não estou a dizer que os homens têm que aprender a dar de mamar, que eles podem aprender, mas não funciona. A biologia.

JORGE C 00:47:28 Não é a biologia.

JMV 00:47:30 E pronto. A biologia não é agora tudo o resto, porque reparaste Tudos magníficos? Eu acho uma perfeita delícia, Porque. Os estereótipos desagregam se, vão, digamos assim, vão se matizando.

JMV 00:47:49 Mas. sobrevivem às vezes em pequenas coisas que, quando obrigadas, são até divertidas, que é de vez em quando pega se em casais e eles concordam que partilham as tarefas. Portanto, isso é um dado adquirido. E depois nós perguntamos.

JORGE C 00:48:10 Vai fazer uma lista?

JMV 00:48:11 Faça uma lista. E sabe como é que aparece uma sobrevivência de estereótipo e assim ele paga os seguros. Ele faz a revisão do carro tal, tal, tal, tal. Quase tudo o que tem a ver com os miúdos. E ela. Ele está a partilhar tarefas. Mas quais tarefas? Tarefas que subconscientemente são consideradas mais masculinas, enquanto as mais femininas que têm sempre relação com o cuidar? Hoje há alturas houve em que a filha mais nova de um casamento sabia que não ia casar porque ia tomar conta dos pais quando eles fossem velhos.

JORGE C 00:48:45 Esse mundo mudou. Agora as mulheres vão tomar conta disto.

JMV 00:48:56 Queria pegar naquele exemplo que disse porque é muito bonito, se disse e as mulheres dão a volta à coisa no estereótipo clássico. Seria uma ingenuidade dizer que as mulheres não tinham poder nenhum.

JORGE C 00:49:11 O poder de influência é um poder.

JMV 00:49:13 E, sem dúvida nenhuma e muitas vezes. Seja em termos gerais, seja os próprios homens, quando se sentem pressionados, diziam assim. Mas no fundo, elas acabam sempre fazer o que querem. Sempre. Pode ser um exagero. Muitas vezes estou aqui para dizer sim, senhor. Era verdade e é verdade. Mas isso não resolve o problema, porque muitas vezes, o que é que acontecia àquela mulher, naquela relação heterossexual? Conseguia obter o que queria. Porquê? Porque dava a volta a aquele homem. Você pode me dizer assim, Mas o resultado final era o que ela queria. Mas o trajeto para lá não é um trajeto democrático e equitativo.

JORGE C 00:50:06 Era sinuoso porque ela.

JMV 00:50:07 Não podia olhar nos olhos e dizer assim Eu acho que era melhor fazermos assim. Não. Ela ia eventualmente deixando uma semente aqui, outra acolá e tal e até acontecia. O que devo lhe dizer? Visto de fora, é divertidíssimo que passado algum tempo aquele homem dizia vamos fazer isto assim, assim, convencido que ele tinha decidido quando ela é que tinha semeado tudo.

JMV 00:50:28 Mas isso não é uma relação equitativa.

JORGE C 00:50:32 Nós estamos praticamente a terminar esta conversa. É saborosa e iria por por aí fora que quero voltar à medicina e à a é a fronteira com a técnica que é. Estão aí as inteligências artificiais ou ditas inteligências artificiais, com máquinas com capacidade de aprender que tecnicamente podem começar a fazer coisas, já estão a fazer umas coisas melhores que os seres humanos. Então e agora? Como é que. Como é que é a medicina? Como é que é o novo médico que aí vem?

JMV 00:50:58 Bom, se quiser, suponhamos que estamos a fazer isto mesmo ao fim da tarde. E eu e o Jorge já estávamos mas era ansiosos por ir para Matosinhos comer um peixe. Eu dizia lhe assim Olha, estou me nas tintas porque isso na psiquiatria não é assim tão fácil. Mas não, eu sou professor de antropologia médica. O tema é fascinante. Primeiro, a inteligência artificial. Pode ser e é de uma utilidade brutal, não só nas questões, digamos assim, mais tecnológicas, mas hoje.

JMV 00:51:35 Daquilo que eu leio não é a minha especialidade, mas por exemplo, em radiologia, em anatomia, patologia, etc. A máquina.

JORGE C 00:51:43 Já vê melhor, a.

JMV 00:51:43 Máquina vê melhor, sobretudo com a capacidade que tem de utilizar os dados de uma forma que nós não somos capazes. Vai à procura.

JORGE C 00:51:55 Dos micro padrões e vai conseguir dizer aqui há uma possibilidade de que possa acontecer uma coisa e viver muito mais cedo do que nós.

JMV 00:52:03 Mas para lhe falar com toda a franqueza, mas aqui é a formação profissional do professor de antropologia médica. Aquilo que me alegra e que me enche de esperança na inteligência artificial É algo de muito mais primitivo a montante, nos profissionais de saúde. A relação profissional de saúde pessoa que vem pedir ajuda pode ser extraordinariamente facilitada pela inteligência artificial. Vou lhe dizer rapidamente porquê hoje as pessoas chegam ao meu consultório e, inevitavelmente falam de seu estado físico, também da sua saúde física. Nós temos, por exemplo, ainda essa essa maleita da análise, que é separar muito o psicológico e o físico, sendo o físico mais, o mais mais honesto e respeitável.

JMV 00:52:57 Por exemplo, uma discriminação que não terminou. E dentro da própria medicina, a psiquiatria continua a ser olhada de lado.

JORGE C 00:53:04 Se me doer a perna e uma perna, se me doer a alma, uma perna.

JMV 00:53:08 Partida, ninguém discute.

JORGE C 00:53:09 Está aqui uma perna partida. Pronto.

JMV 00:53:11 Uma neurose grave. Alguém diz que há exagero ali, não sei quê e tal e tal e tal e tal. E isto inclusivamente levar nos ia longe, porque neste momento preocupa me na psiquiatria um certo movimento de alguns colegas se refugiarem na prescrição e depois dizerem às pessoas uma coisa que é bem intencionada, mas que deixa, na minha opinião, mal colocada, a psiquiatria. Quer dizer, e agora vou lhe dar um nome de um psicólogo porque faz lhe bem falar com alguém. Se o psiquiatra não fala com as pessoas, então isto não é psiquiatria, é simplesmente estar a receitar. O que é que eu lhe ia dizer? As pessoas chegam lá e dizem assim O senhor quer ver as minhas análises. Por exemplo, eu só tenho consulta daqui não sei o quê.

JMV 00:54:02 Deixa me tal está à vista. E falam. E cada vez mais eu oiço isto. Eu gosto muito do meu médico de família ou da minha médica. Os que têm. Há 1 milhão e não sei quantos que não têm. Enfim, coisas tristes. Mas sabe de uma coisa? Eu agora quase que não o vejo. Eu só vejo a parte de trás do computador.

JORGE C 00:54:28 Está lá no consultório, mas está em casa.

JMV 00:54:31 E eu tenho que lhe dizer assim olha, se calhar vai achar que eu estou a defender o meu sindicato. Mas eu vou lhe dizer uma coisa o meu colega se não preencher aqueles campos todos, está metido numa enrascada.

JORGE C 00:54:45 Porque tem que fazer o registo.

JMV 00:54:46 Tem que fazer aquelas coisas. Bem, a inteligência artificial pode libertar brutalmente o diálogo com o doente ou a pessoa que não está doente, mas vai uma consulta até.

JORGE C 00:54:58 Colocando logo as análises dentro do relatório clínico e aquilo já está feito. Não é preciso travar.

JMV 00:55:02 A conversa catalogando a.

JORGE C 00:55:05 Tensão arterial. Aquilo automaticamente registar, claro.

JMV 00:55:07 Aliás.

JORGE C 00:55:08 Facilitar nos a vida.

JMV 00:55:09 Hoje em dia com coisas destas, não é? Você anda calmamente à beira rio e isto está lhe a mandar tudo para o seu médico, etc.

JORGE C 00:55:16 Depois pode fazer uma interpretação e usar. Lá está a sua inteligência apenas para para ter um contexto para perceber e.

JMV 00:55:21 Portanto isto, digamos assim. Só isto. Não estou a falar sequer do resto. Só isto é uma ajuda verdadeiramente brutal. Mas atenção, porque quando nós falamos de inteligência artificial, de vez em quando falamos de inteligência artificial, como se por trás da inteligência artificial não existissem seres humanos. Os algoritmos foram fabricados.

JORGE C 00:55:47 Podem ser bons.

JMV 00:55:47 Ou maus, podem ser bons ou maus. Porquê? Porque quem os programa o constrói. Enfim, os termos técnicos também está sujeito, por exemplo, a preconceitos.

JORGE C 00:55:57 E a vieses.

JMV 00:55:58 E havia exactamente. Agora veja se o algoritmo honestamente lhe responde que a população negra nos Estados Unidos está em melhor estado de saúde do que a branca.

JORGE C 00:56:12 Suspeito que é uma mentira.

JMV 00:56:14 Olha para aquilo e diz Enlouqueceu.

JMV 00:56:18 Em geral não enlouqueceu. Sabe porque é que ele disse aquilo? Porque foi programado para fazer análises assim. Quem é que vai aos hospitais e internava nos Estados Unidos sem seguro de saúde? Está no mato. Os negros têm muito menos que os brancos. O algoritmo diz Há muito, muito menos internamentos de negros de brancos tão altos. Ou seja, como você diz, o algoritmo quando está enviesado, não é culpa dele. Foi programado dessa maneira.

JORGE C 00:56:50 O que implica que pensemos o algoritmo não só como uma questão técnica, mas também como uma questão. Enfim, política de pensamento da maneira como o algoritmo pode ser feito, não deixemos, não deixemos isto só para os engenheiros.

JMV 00:57:02 O algoritmo pode ser utilizado para nos manipular. Mas só Jorge sabe isso melhor que eu. Saia do campo da saúde. Vá para o Instagram.

JORGE C 00:57:14 Lá está o algoritmo a mostrar aquilo que queremos ver.

JMV 00:57:16 O Jorge três dias seguidos aparece lhe música clássica e o Jorge põe o like. No quinto ou no sexto.

JORGE C 00:57:24 Dia é só música, passe.

JMV 00:57:25 O exagero está.

Speaker 4 00:57:27 À.

JMV 00:57:27 Rasca para encontrar alguma coisa que não seja música clássica? Lá se vai a diversidade. Não é porque você, acima de tudo, é um consumidor e aquilo está programado para o consumidor.

JORGE C 00:57:38 Então vou vender aqui uns discos que tens aqui, já que gostas de música clássica e cá está.

JMV 00:57:43 Percebe? Sei lá. Eu não lhe escondo, por exemplo, que o algoritmo a mim topou me logo e eu levo com tudo o que acontece aos netos dos Beatles, aos filhos dos Beatles, aos Beatles antes de eles serem Beatles, etc. Tudo isso, nesse aspecto, é cego. Agora, há outras questões que depois se levantam, que é em termos profissionais. Como é evidente, a inteligência artificial pode e vai mandar para o desemprego milhões de pessoas que têm que ser recicladas, digamos assim, para o tipo de profissões, os médicos também. Há especialidades que estão muito mais em risco que outras. Mas repare, isso também não começou agora, sei lá.

JORGE C 00:58:27 A robótica na cirurgia, por exemplo.

JMV 00:58:29 Onde era o que eu ia dizer? Eu sou, digamos assim, não um orgulhoso, mas o paciente portador de uma prostatite para aí há 15 anos, quando ela me foi diagnosticado, ninguém me disse se um dia é step a torto e a degenerar. Vamos operar te com um braço robótico. Mas quem é que falava de braço robótico naquela altura?

JORGE C 00:58:56 Talheres e mão de cirurgião não cirurgião?

JMV 00:58:58 Ora, o braço robótico tem uma precisão aparentemente muito maior. abençoada, portanto.

JORGE C 00:59:05 Faz menos estragos e consegue ter uma maior precisão agora. Estando lá, o médico pára para carregar no botão, espero eu.

JMV 00:59:10 Mas agora, depois a outras questões é que a inteligência artificial também se engana, o que é uma coisa estranha, porque nós estamos muito programados para confiar mais nas máquinas que nas pessoas, porque achamos que as máquinas estão ali. Funcionam. Ponto final. Parágrafo.

JORGE C 00:59:29 Quando a máquina se enganar e nós não soubermos onde raio é que ela se enganou e pior, não soubermos em que parafuso é que asneira.

JMV 00:59:37 Até até pode acontecer em aspectos éticos para sairmos da saúde numa determinada altura.

JMV 00:59:46 Um senhor inglês escreveu para o Guardian dizendo que estava a escrever um artigo científico sobre determinado tema. Já não sei qual era e que estava a ter dificuldades em encontrar dois artigos de dois jornalistas do Guardian especializados naquela área. Se o Guardian podia ajudar e o Guardian pediu aos jornalistas que fornecessem, jornalistas disseram Nunca escrevemos estes artigos.

JORGE C 01:00:13 Ou.

JMV 01:00:14 Confusão. Então o que é que tinha acontecido? Ele tinha feito uma busca e o algoritmo tinha sido tão prestável, tão gentil, que lhe tinha dado tudo o que tinha encontrado e, além disso, reescrito ao estilo daqueles dois jornalistas. Passava por serem textos deles? Perfeitamente. Era o estilo deles. Dois artigos que não tinham eles, Só que não existiam.

JORGE C 01:00:41 A falsidade com imagem de verdade.

JMV 01:00:44 Ou seja, o que eles chamam, Se bem me lembro, o algoritmo alucina também. Bem, essas coisas são complicadas. Agora, o que nunca podemos esquecer é o fator humano que há uns meses, penso eu que já são dois meses sem um artigo que pôs toda a gente a discutir.

JMV 01:01:01 Porquê? Porque foram perguntar a doentes? Que respostas é que eram mais adequadas para eles? E esses respostas eram dadas para o algoritmo e X por médicos humanos. Porque agora já já há agentes externos, artigos médicos, humanos com médicos não humanos. Pronto. E os algoritmos ganharam. E a primeira interpretação foi Epa! Isto mostra que eles são melhores do que nós. E depois pensou assim Espera aí. E se pensarmos ao contrário? Terão sido estes médicos recentemente empáticos? Como é que uma máquina é mais empática do que uma pessoa? Se calhar estes médicos estavam no fim do turno, chateados ou isto ou aquilo e podiam ter feito melhor porque disse que estávamos no fim. Se calhar é uma boa maneira de acabarmos.

JORGE C 01:02:03 Empatia e empatia é sempre uma boa forma de.

JMV 01:02:06 Empatia. Vamos ver. Aliás, ainda outro dia eu e o meu filho mais novo nos divertíamos porque o chat PT ensinavam nos boas maneiras. E ele pôs uma terminada questão, não é? E pronto. Chat pt acho esta maneira de perguntar um bocado seca e rude como é que eu poderia perguntar este é o chat PT respondeu Olhe, pergunte desta maneira, assim, assim, assim, assim E como era uma coisa médica, no fim dele dizia mas.

JMV 01:02:44 Embora lhe tenha dado a minha opinião, etc, etc, aconselho a visitar um médico e pronto, isto está perfeitamente certo. Agora há uma coisa que, pelo menos por enquanto, ninguém me convence que se pode pedir a um algoritmo. O algoritmo não viveu. O algoritmo pode, por exemplo, perante o Jorge, estando numa situação de luto que está a ser difícil ultrapassar, etc. O algoritmo pode ter milhares de frases de apoio.

JORGE C 01:03:20 Mas não sofre como muitos sofremos.

JMV 01:03:22 Mas nunca passou por isso. E aí depende da pessoa. Por exemplo, uma coisa que vai ser interessante verificar. Nós temos alguns estudos que dizem que nas camadas mais jovens, as camadas mais jovens querem respostas mais rápidas e que eventualmente não valorizam tanto isso. Mas há uma coisa que lhe digo aquilo que você sente, porque eu passei por lá, como todos nós já passamos. Aquilo que você sente com um ser humano que o apoia, às vezes até com um silêncio, mas que você, com razão ou sem ela, pressente. Este tipo está a entender, está aqui para mim, etc.

JORGE C 01:04:07 Há um vínculo e.

JMV 01:04:08 Se isso não é possível com a inteligência artificial. E agora cuidado porque pode dizer ainda hoje eu respondi isso a um convite gentil que me que me endereçaram para uma conferência para comparar e então dizia o confronto entre inteligência artificial e uma pessoa da geração e disse Eu não vou fazer confronto nenhum, porque para mim não há confronto, somos complementares. Agora, você também tem hoje em dia artigos médicos que dizem no futuro, os médicos serão substituídos por algoritmos, por por máquinas, porque elas têm inclusivamente uma vantagem e que são isentas. Não há desconfianças em relação a elas. São melhores em termos de segredo médico. Tudo o que quiser.

JORGE C 01:04:55 Não tenha sentimentos.

JMV 01:04:59 Eu, na minha idade e ainda por cima sendo um tipo preguiçoso, eu hoje em dia nunca vou procurar novos exemplos. Nunca, nunca é uma palavra que nunca se deve dizer, mas é muito raro. Eu reenvio a filmes e livros também, mas há filmes que envelhecem, estão datados e há outros que resistem. Se você for rever O20012011 ser no espaço, você vê quão genial aquilo é.

JMV 01:05:35 Podia não ter mais nada. Mas o que é que tem? Tem um computador que não está disponível para ser desligado? Computador Esse cometeu um erro, mas tem instinto de sobrevivência. Quer dizer, a mim não me desligam. E se bem se lembram, ele lê nos lábios e começa a acertar o passo a todos. Um safas. O que é que faz? Vai desligá lo? E esta cena é genial. Claro, para um psiquiatra é fascinante. Ainda mais porque o Kubrick ou o argumentista. Confesso que não sei se o argumento é do Kubrick. Ele dá uma visão antropomórfica da máquina. A máquina primeiro pede, não desliga, faz promessas. Eu nunca mais faço mal a ninguém. Eu nunca mais engano, argumenta e argumenta num tom de afeto. Mas o mais genial de tudo é que, à medida que ele vai desligando, a máquina vai regredindo à infância. Lembra se e acaba a dizer Eu fui construído pelo engenheiro não sei quê no sítio estatal. Isto é espantoso, mas nunca acontecerá porque a máquina não se pode sentir a morrer e a ter a nostalgia da infância porque não a viveu.

JMV 01:06:59 Dir me ão em 90% dos casos isso não tem importância nenhuma. Dou de barato. Mas chamar empatia a qualquer coisa que se passa entre quem viveu com nódoas negras e com grandes alegrias. E quem ouviu as nódoas negras aprendeu as respostas adequadas, mas não as sentiu. Não é a mesma coisa a empatia.

JORGE C 01:07:23 A par das nódoas negras e das grandes alegrias, são provavelmente a única receita para a partilha entre seres humanos. Compreender os outros implica nos a todo o momento e as máquinas capazes de calcular rapidamente, muito rapidamente e guardar acervos de informação gigantescos. Não têm alma. Podem saber, podem fingir, mas nunca sentiram a palpitação dos grandes amores, nem o sabor das lágrimas amargas, nem sequer lágrimas de óleo ou taquicardias eléctricas.

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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL MUDARÁ A NOSSA SAÚDE? RICARDO BAPTISTA LEITE
A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL MUDARÁ A NOSSA SAÚDE? RICARDO BAPTISTA LEITE

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O QUE DIZEM AS PALAVRAS SOBRE NÓS? Marco Neves
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Onde guarda as palavras o cérebro? Joaquim Ferreira
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Como ganhar umas eleições? Germano Almeida
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Como praticar a arte da escuta? Júlio Machado Vaz
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Portugal, quando começas a jogar? Rui Miguel Tovar
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O futebol é bom para o marketing? Daniel Sá
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Como fotografar a emoção do futebol? – Miguel A Lopes
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Busco a escuta perfeita.

Não a escuta do som, mas também essa.

Busco essa afinação perfeita entre a fala e o silêncio.

Onde cada respiração pode descobrir a raiz de uma dor de alma.

E onde a empatia é o instrumento que abre espaço à confiança obrigatória para que quem sofre possa falar, e quem ouve possa escutar.

Sigmund Freud inventou o sofá que fala.

O sofá onde todos nos podemos deitar para falar connosco próprios sabendo haver um psiquiatra, psicanalista ou psicólogo na cabeceira dessa cama existencial para nos ajudar nessa caminhada por entre sintomas, dores, desejos e desejadas ressurreições de alma.

Nesta edição vou guiado pelo psiquiatra que conheci como ouvinte há mais de 30 anos quando ficava colado à telefonia para ouvir o seu programa “O sexo dos anjos”

Um roteiro que começou por ser uma ideia de programa para falar de sexualidade, mas acabou por ser um manual sobre a natureza humana.

Portanto, conheci o homem da rádio muito antes do psiquiatra e do professor de antropologia médica.

Esta conversa poderia demorar 10 horas. Até poderia ser um diálogo em associação livre, mas escrevi demasiadas perguntas para tantas respostas.

É uma lição sobre como ouvir os outros, como praticar a arte da escuta e de aceitar e compreender o outro como ele é.

Falámos de diálogos, palavras e silêncios.

A empatia a par das nódoas negras e das grandes alegrias são provavelmente a única receita para a partilha entre seres humanos.

Compreender os outros implica-nos a todo o momento.

E as máquinas, capazes de calcular rapidamente e guardar acervos de informação gigantescos não tem alma.

Podem saber. Podem fingir. Mas nunca sentiram a palpitação dos grandes amores nem o sabor das lágrimas.

Nem sequer lágrimas de óleo ou taquicardias elétricas.


TÓPICOS:

Início (00:00:00)

Introdução ao Tema da Escuta (00:00:12)
Discussão sobre a escuta e a importância da empatia na comunicação.

Apresentação do Convidado (00:02:27)
Júlio Machado Vaz é apresentado como médico psiquiatra e influenciador.

O Programa “O Sexo dos Anjos” (00:02:50)
Júlio fala sobre o seu livro e a história do programa de rádio.

Impacto do Programa (00:03:14)
Discussão sobre a influência do programa na sexualidade e na sociedade.

Relação entre Rádio e Televisão (00:05:02)
Comparação entre os meios de comunicação e as suas diferenças na recepção do público.

Censura nos Média (00:06:21)
Júlio compartilha experiências de censura e a diferença entre rádio e televisão.

Mudança de Horário do Programa (00:07:16)
Discussão sobre a mudança de horário do programa e o impacto na audiência.

Experiências de Censura (00:09:41)
Relato sobre censura num programa de televisão, especialmente em relação à homossexualidade.

Fascículos Não Publicados (00:12:20)
História sobre fascículos encomendados pelo jornal “Expresso” que nunca foram publicados.

Reflexão sobre a Vida (00:13:39)
Júlio reflete sobre o envelhecimento e como as prioridades mudam ao longo do tempo.

Cuidado com a Manipulação (00:15:03)
Discussão sobre a capacidade de nos enganarmos a nós mesmos e a diferença entre responsabilidade e culpa.

Consultório e Trabalho (00:15:46)
Júlio fala sobre a sua rotina no consultório e o prazer que sente em continuar a atender.

Ritmo de Trabalho (00:16:56)
Reflexão sobre a escrita e a falta de tempo devido à rotina intensa de trabalho.

Agendas Complicadas (00:18:04)
Desafios de compatibilizar horários entre colegas para gravações e compromissos.

Visita Guiada à Agenda (00:19:07)
Comentário sobre a complexidade das agendas de trabalho e compromissos.

Reorganização de Trabalho (00:19:32)
Impacto das mudanças de horários na rotina de trabalho dos colegas.

Psicanálise e Trabalho (00:20:13)
Reflexão sobre a importância do trabalho e a dificuldade de imaginar não trabalhar.

Dia Típico no Consultório (00:21:09)
Descrição de como varia a rotina diária de atendimentos e a importância da escuta.

A Arte da Escuta (00:22:11)
Discussão sobre a escuta na psiquiatria e a necessidade de estar presente para os pacientes.

Desafios das Consultas (00:23:03)
Variedade das queixas dos pacientes e a experiência pessoal de Júlio com problemas psicológicos.

Aprendizado com a Depressão (00:24:11)
Júlio compartilha a sua experiência com a depressão e como isso influenciou o seu trabalho.

Importância da Psicanálise (00:25:01)
Reflexão sobre o papel da psicanálise na vida de Júlio e a gratidão ao seu psicanalista.

Silêncio na Terapia (00:25:50)
Discussão sobre a natureza do silêncio nas sessões de terapia e o seu significado.

Silêncios Confortantes (00:26:30)
Exploração dos diferentes tipos de silêncios e como eles podem ser reconfortantes.

Dificuldade em Expressar Sentimentos (00:26:51)
Júlio fala sobre a dificuldade dos pacientes em expressar as suas emoções durante a terapia.

Caminho Difícil da Terapia (00:27:30)
Reflexão sobre a escolha de enfrentar a dor em vez de optar por soluções mais fáceis.

A percepção da responsabilidade (28:07)
Discussão sobre como a percepção de ser vítima pode distorcer a realidade.

Reconstruindo a vida (29:38)
Reflexão sobre a importância de assumir responsabilidades e reconstruir a vida após dificuldades.

Lutos e padrões de comportamento (30:22)
Análise dos lutos emocionais e como moldam os nossos comportamentos e reações.

Aprendendo com os outros (31:07)
Exploração de como aprendemos a lidar com frustrações e desejos através das interações sociais.

Padrões infantis na vida adulta (32:30)
Discussão sobre como padrões de comportamento infantis podem persistir na vida adulta.

Mudanças ao longo da vida (34:04)
Reflexão sobre as mudanças que ocorrem com o tempo e a importância da experiência.

Relações e negociações (34:38)
Importância de negociar visões diferentes em relacionamentos para uma convivência saudável.

Paradigma da medicina (35:52)
Discussão sobre a evolução do paradigma médico, de curar doenças a cuidar de pessoas.

A complexidade da saúde (40:22)
Reflexão sobre a saúde ser uma questão complexa que vai além do tratamento de doenças.

A flexibilidade de género (00:42:17)
Discussão sobre as múltiplas configurações de género e a flexibilidade nas decisões.

Estereótipos de género (00:42:46)
Reflexão sobre estereótipos de homens e mulheres e as suas influências nas esferas pública e privada.

Mudanças na paternidade (00:43:47)
Mudanças nas relações entre pais e filhos, destacando a afetividade dos homens.

Evolução dos homens (00:44:23)
Os homens estão se afastando do estereótipo de força e bruta, explorando afetividade.

Vantagens emocionais (00:45:05)
Mudanças emocionais nos homens e como isso impacta as suas vidas.

Pressões sociais e feminismo (00:45:06)
Discussão sobre como as pressões sociais e o feminismo influenciam os homens.

Divisão de tarefas (00:46:46)
Reflexão sobre a divisão de tarefas domésticas entre casais e a semântica do “ajudar”.

Mudança de papéis (00:47:12)
A evolução dos papéis de género e a partilha de responsabilidades na casa.

Poder de influência feminino (00:49:11)
Discussão sobre o poder de influência das mulheres nas relações heterossexuais.

Relações não equitativas (00:50:06)
Análise das dinâmicas de poder nas relações, onde as mulheres influenciam indiretamente.

Inteligência artificial na medicina (00:50:32)
Reflexão sobre o impacto da inteligência artificial na prática médica e na relação com pacientes.

Utilidade da inteligência artificial (00:51:35)
A inteligência artificial pode melhorar diagnósticos e facilitar a comunicação entre médicos e pacientes.

Separação entre psicológico e físico (00:52:57)
Discussão sobre a discriminação da psiquiatria relativamente à medicina física.

Desafios da psiquiatria (00:54:02)
Preocupações sobre a prática psiquiátrica e a importância da comunicação com pacientes.

Facilitação do diálogo (00:54:58)
A inteligência artificial pode facilitar o diálogo entre médicos e pacientes, melhorando a experiência.

Preconceitos nos algoritmos (00:55:47)
Reflexão sobre como preconceitos humanos podem influenciar a programação de algoritmos.

Análise crítica dos algoritmos (00:56:18)
Discussão sobre a necessidade de considerar o viés dos algoritmos na saúde e na sociedade.

Manipulação do Algoritmo (00:57:02)
Discussão sobre como os algoritmos manipulam as nossas preferências e a diversidade de conteúdos disponíveis.

Inteligência Artificial na Medicina (00:58:27)
Referência à robótica na cirurgia e ao impacto da inteligência artificial na prática médica.

Confiabilidade das Máquinas (00:59:10)
Reflexão sobre a confiança nas máquinas e as suas falhas, especialmente em contextos éticos.

Falsidade Algorítmica (01:00:14)
Exemplo de como algoritmos podem criar conteúdos falsos que parecem verdadeiros, confundindo os utilizadores.

Empatia e Inteligência Artificial (01:02:06)
Discussão sobre a limitação da inteligência artificial em replicar empatia humana em situações emocionais.

Complementaridade entre Humanos e Algoritmos (01:04:08)
Afirmativa de que humanos e máquinas devem ser vistos como complementares, não concorrentes.

Limitações da Máquina (01:06:59)
Reflexão sobre a incapacidade das máquinas de experimentar emoções e a verdadeira empatia humana.

A Alma Humana na Comunicação (01:07:23)
A importância da experiência humana na compreensão e na comunicação, além da capacidade técnica das máquinas.

LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

JORGE C 00:00:12 Ora vivam! Bem vindos ao Pergunta Simples o vosso Podcasts sobre Comunicação. Nesta edição busco a escuta perfeita, não a escuta do som, do som perfeito, mas também é essa a escuta do outro, a escuta da outra pessoa. Busco essa afinação perfeita entre a fala e o silêncio, onde cada respiração pode descobrir a raiz de uma dor de alma ou de uma alegria intensa, e onde a empatia é o instrumento que abre espaço à confiança obrigatória para quem sofre poder falar, para quem ouve poder escutar. Um tal de Freud, Sigmund Freud inventou o sofá que fala, o sofá onde todos nos podemos deitar para falar connosco próprios, sabendo que há um psiquiatra, psicanalista ou psicólogo ali na cabeceira dessa cama existencial, para nos ajudar nessa caminhada por entre sintomas, dores, desejos e até ressurreições de alma. Nesta edição vou guiado pelo psiquiatra que conheci como ouvinte há mais de 30 anos, quando ficava colado à telefonia para ouvir o seu programa O Sexo dos Anjos, num roteiro que começou por ser uma ideia de programa para falar de sexualidade, mas que acabou, afinal, por ser um manual sobre a natureza humana.

JORGE C 00:01:38 Portanto, conheci o homem da rádio muito antes do psiquiatra e do professor de antropologia médica. Esta conversa poderia durar dez horas. Até poderia ser um diálogo em associação livre. Mas escrevi demasiadas perguntas para tantas respostas e o tempo não perdoa. É uma lição sobre como ouvir os outros, como praticar a arte da escuta e de como aceitar e compreender o outro como ele é. Falamos de diálogos, de palavras e de silêncios. Se gostarem, partilhem com os amigos e não se esqueçam de subscrever. É gratuito e fácil. Em pergunta simples como. Vive a professora? Olá! É muito fácil apresentá lo. Médico, psiquiatra, Professor de antropologia, Médica Humanista. Um influenciador até quarta influência.

JMV 00:02:27 Não, não, não sou. Eu ia sugerir uma coisa muito mais simples, que é dono da casa, dono da casa. Você está em minha casa. Obrigado por me receber em primeiro lugar, com todo prazer.

JORGE C 00:02:35 E é uma honra. Ainda por cima estávamos aqui a conversar um bocadinho que eu estava de de viagem vindo do Alto Minho, de Viana do Castelo, de Carreço e a primeira notícia do dia escreveu lá um livro.

JMV 00:02:50 Escrevi o primeiro livro, Sim, o primeiro livro O Sexo dos Anjos. Não totalmente, mas o porque O sexo dos anjos. Não estamos a falar de. Nós estamos a falar de uma coisa que tem 30 anos. Portanto, para muita pessoa que está a ouvir que não faz a mínima ideia do que eu estou a falar, que julho.

JORGE C 00:03:13 Era esse de há 30 anos.

JMV 00:03:14 Era o Júlio que fez com Aurélio Gomes, com José Zé Gabriel, o Sexo dos Anjos, de 89 a 95, se bem me lembro.

JORGE C 00:03:22 Na Rádio Nova, um programa mítico da rádio.

JMV 00:03:24 Portuguesa.

JORGE C 00:03:26 Onde se falava da Insustentável Leveza do Ser, do Milan Kundera.

JMV 00:03:29 Foi o primeiro livro que se falou e foi o livro que me marcou na realidade O início do Sexo dos Anjos. Porque o que o Aurélio me propôs o Aurélio tinha assistido a um dos meus cursos de sexualidade em Biomédicas. O Aurélio era era finalista de Psicologia e o qual me propôs foi um muito respeitável programa sobre educação sexual e eu gosto sempre de dizer que eu chegava lá e tentava o meu melhor para adormecer os ouvintes, porque dizia hoje vamos falar de determinada disfunção sexual.

JMV 00:04:05 O Aurélio punha se em automático oitavo para maturar. Fazia as perguntas certas, como é óbvio. Eu lá respondia E um dia o Aurélio devia estar já pelos cabelos e eu entrei para fazer o programa. E levava a insustentável leveza do ser debaixo do braço. E o Aurélio diz Anda a ler Kundera está a gostar. Eu disse estou. E aí começou o sexo antes. Nunca mais eu entrei com um tema de sexologia pura e dura e a partir daí era sobre os filmes, os livros, Associação Livre, Pronto.

JORGE C 00:04:42 A partir do Sexo dos Anjos a um psiquiatra antes do sexo dos anjos e um psiquiatra depois. Não.

JMV 00:04:49 Psiquiatra seguramente não. O que o sexo dos anjos contribuiu? Porque o Sexualidades teve uma quota parte de responsabilidade muito maior. E depois.

JORGE C 00:05:02 A televisão e a.

JMV 00:05:03 Televisão com o seu poder brutal. Isso aí nasceu o monstro do sexólogo, naquela altura uma espécie de sexólogo oficial do regime, digamos assim, o que teve pontos muito agradáveis. As pessoas trataram me trataram com extraordinária gentileza. Teve pontos desagradáveis, como por exemplo, o programa ser censurado.

JMV 00:05:23 Mas o que eu não estava preparado era para aquele tipo de choque mediático. Não sei se está de acordo comigo, mas a rádio é um clube de fãs e uma delícia. E a voz é o risco, porque é.

JORGE C 00:05:36 Uma família.

JMV 00:05:37 Sob muitos aspetos. Quando? Quando? Já está a ouvir rádio, ao fim de 10/2. Se o que ouve não lhe interessa, muda, vá se embora. Ou então não tem bom senso nenhum e é masoquista. Na televisão as pessoas podem distrair se com o décor. Como é que ele está vestido? Como é que aquela rapariga também está vestida e como é que eles estão em termos de idade, etc. Há uma data de motivos de distracção que na rádio não existem.

JORGE C 00:06:07 Mas há uma amplificação maior, porque agora, em termos.

JMV 00:06:09 De público.

JORGE C 00:06:10 Há liberdade de O que se pode dizer na telefonia, na rádio é diferente daquilo que se pode dizer na televisão. Comigo foi. Como é que foi? Como é que foi? Como é que foi esse episódio? Comigo foi.

JORGE C 00:06:21 Estamos na era hoje é que estamos mesmo na era do politicamente correcto. Onde? Onde? Uma palavra que um que seja colocada na casca de banana dá direito ao cancelamento, Dá direito quase a uma perseguição digital?

JMV 00:06:34 Sim. Bom, naquela altura, a perseguição digital seria uma expressão de ficção científica. Havia tecnologia, mas não aquilo que existe hoje. Mas deixe me dar um exemplo. Que eu me lembre, nunca houve um programa do sexo dos anjos censurado. Aliás, houve muitos programas de sexo dos anjos que foram feitos em directo, como diria Solar para Alice. É difícil censurar o Direito.

JORGE C 00:07:05 Está feito, está feito.

JMV 00:07:06 Está feito, Está feito. Porque o que acontecia era que eu vivia por cima da Rádio Nova.

JORGE C 00:07:11 Isso aqui é um luxo ou um desassossego? Depende. Se fizermos primeiro.

JMV 00:07:16 É um luxo. E de vez em quando. E houve duas fases. Primeiro, sexo dos anjos. Era só a noite? Era. E nós sempre achámos que era um programa noturno, digamos assim. Mas já lhe vou explicar como isso foi uma cura de humildade para nós.

JMV 00:07:33 E numa determinada altura e muito bem, a Rádio Nova disse Atenção, o programa vai passar também domingo à hora do almoço e nós ficámos para morrer, Dissemos. Mas os discos, nós passamos, aquilo de que falamos, etc. Aquilo é mesmo para os que estão pela noite fora, uns a estudar, outros no fim do dia de trabalho. Ainda por cima, se me permite mais nessa altura, uma demonstração. Eu gosto de acreditar que inconsciente de misoginia, porque o programa À hora do almoço disparou em audiência feminina.

JORGE C 00:08:07 Portanto, os homens ouviam mais. À noite, lá está, e havia muitas mulheres.

JMV 00:08:11 Mas à hora do almoço, meu caro amigo, democratizou se. Quem é que normalmente está na cozinha, não é? A pedalar naquela altura e hoje em dia, enfim, felizmente mitigado. Mas não desapareceu.

JORGE C 00:08:22 Não havia podcasts, portanto ouvia ou se ouvia em directo ou não se ouvia.

JMV 00:08:27 Havia pessoas que faziam o seguinte Gravavam, por exemplo, cassetes e mandavam para filhos, filhas, namoradas, etc.

JMV 00:08:35 Estavam a estudar em Inglaterra. Eu tenho cassetes dessas pessoas. Me entregaram achando que eu ia ter prazer nisso.

JORGE C 00:08:41 Tu queres ver que Júlio Machado Vaz é o homem que inventou o podcaster?

JMV 00:08:44 Não. Nem de perto nem de longe. Pronto e e portanto, nunca houve, que eu me lembre, censura no sexo dos anjos. Em contrapartida, na televisão houve pelo -1 uma situação em que. Misteriosamente, uma parte de um programa desapareceu. Como se tornar coincidência, era a parte em que o meu velho amigo Dr. Afonso Albuquerque estava a falar de homossexualidade e resolveu tirar da manga Das percentagens estimadas de homossexuais. Pronto. E disse qualquer coisa como 6%, 7% e tal. E então, como estava em associação livre, o que nós fazíamos todos foi por ali fora. Foi prolífero e disse Suponhamos, nós temos X deputados. Se isto fosse automático, tantos seriam homossexuais. Pronto, seria o programa Ponto Final parágrafo.

JORGE C 00:09:41 E o editor do programa começou a fazer contas. A vida começou.

JMV 00:09:43 Não sei quem foi porque oficialmente foi um acidente.

JMV 00:09:47 Um acidente muito circunscrito. Porque na semana seguinte o Afonso telefonou me furibundo e disse Eu não admito que me censurem. Eu não sabia o que é que ele estava a falar e fui perguntar. E então apareceu me uma vítima designada que disse que tinha cometido um erro e que logo aquela parte é que tinha saído. Pronto, isso é a primeira questão. Depois o Carlos Cruz teve a delicadeza de me dizer Olhe, há pessoas que acham que o Júlio fala demasiado da influência das instituições na área da sexualidade e menos de sexo puro e duro. Fala a vontade de sexo puro e duro, mas as instituições deixem em paz. Eu não me pesava na consciência ter dito fosse o que fosse, na minha opinião, de ofensivo. O que é facto é que depois eu fui buscar um episódio da Bíblia para ilustrar uma questão erótica e na semana seguinte tinha passado de um horário que eu nunca tinha pedido. Eu sempre pensei que o Sexualidades fosse um segundo canal, mas não. Estava no primeiro canal e passei das 23h00 no primeiro canal para 01h30 da manhã.

JMV 00:11:05 No segundo canal, um horário de filme pornográfico, alguma coisa assim.

JORGE C 00:11:08 Portanto, foi escondido.

JMV 00:11:09 Foi completamente escondido. Há muitas maneiras de censurar e isso foi pena. Foi pena porque nós, porque o programa não era feito só por mim e era feito com muito gozo. Nós recebíamos abaixo assinados de de, dos liceus, dos conselhos diretivos, etc, dizendo Nós gravávamos o programa e discutíamos aqui, mas agora nunca se sabe a que horas e no canal a horas terríveis, etc. E nós já tínhamos que explicar. Não somos nós que mandamos nisto, não é? E portanto, isso foi. Isso foi um segundo episódio. Mas há um episódio. Vou lhe dar. Vou lhe dar algo que penso que nunca disse em público. Um. Um jornal que eu sempre li, que continuo a ler quem sou, de qual sou subscrito ou que o Expresso um dia pediu para falar comigo e com uma enorme gentileza, perguntou me se eu não queria coordenar dez ou 12 fascículos sobre sexualidade. Eu fiquei um bocado atrapalhado que aquilo iria dar uma trabalheira desgraçada.

JMV 00:12:20 Eu tinha que ir pedir aos especialistas, não é porque eu não. Eu não gosto de assumir aquilo, aquele comportamento um bocado português que é, eu sei um bocadinho de tudo.

JORGE C 00:12:34 Portanto, fez de curador, fez de editor. E foi.

JMV 00:12:36 Fui à procura. Foi a sociedade portuguesa Sexologia Clínica, disse ao Gente. Propuseram nos isto. Isto é algo que nos honra. O Expresso e o Expresso.

JORGE C 00:12:47 Vamos à procura de temas. Vamos à procura de ocupar este espaço na agenda.

JMV 00:12:50 E fizemos isso. Deu muito trabalho. Fizemos 12 fascículos que foram entregues ao Expresso. O Expresso pagou religiosamente os 12 fascículos e cada um dos autores e os fascículos nunca foram publicados. Ficaram algures algures numa gaveta e é difícil de acreditar que um jornal encomende e pague qualquer coisa para depois não publicar. Portanto, alguém considerou que aquilo eventualmente poderia atentar contra a moralidade dos portugueses. Como é que.

JORGE C 00:13:25 Reage? Um psiquiatra perguntaria como é que se sentiu quando acontecem coisas dessas. Como é que o Júlio Machado Vaz. Gere as suas próprias neuras?

Speaker 3 00:13:37 Mau.

JMV 00:13:39 Muitas vezes é um ser humano como os outros. Eu espero bem que sim, mas não sei. Há uma velha história na psiquiatria que os psiquiatras encontram se e dizem tu estás bem e eu, Portanto, eu posso fazer esse jogo consigo também. Jorge está com bom aspeto, Está bem, É ou não é? Mas aí eu devo lhe dizer eu não sou. Há um amigo meu que diz Pois se não fosse a morte estar mais perto, eu só via vantagens Eu não sou um pessimista quanto ao envelhecimento e o envelhecimento nisso ajudou muito. Tranquiliza Sim.

JORGE C 00:14:16 Pacificou.

JMV 00:14:17 Muito. Há coisas que que me poriam e que me puseram a trepar pelas paredes há 20 ou 30 anos atrás e que hoje em dia me fariam sorrir e seguir em frente.

JORGE C 00:14:27 Relativizar e deixar andar.

JMV 00:14:28 Sim, porque nós reorganizamos as nossas prioridades.

JORGE C 00:14:33 Mesmo quando desfeita.

JMV 00:14:35 Isso foi mais complicado porque eu andei a pedir desculpa a cada um dos autores por quem os tinha desencaminhado para trabalhar e trabalhar. Forte tinha sido eu. Portanto, eu sentia me responsável.

JORGE C 00:14:48 E quando e quando? Quando se sente responsável por por alguma coisa essa esse ato de contrição, de pedir desculpa é uma coisa que acontece normalmente ou há coisas que precisa de passar tempo para perceber?

JMV 00:15:03 Cuidado porque nós somos muito capazes de nos manipularmos a nós mesmos de uma forma magistral.

JORGE C 00:15:10 Somos, somos cegos ou fazêmo lo mesmo de uma forma deliberada.

JMV 00:15:14 Deliberada, muitas vezes inconsciente ou de uma forma deliberada. E, portanto, eu não posso garantir que não haja situações em que, eu não me engano, a mim mesmo para me desculpabilizar. A única coisa que eu posso ser é assim se eu chego à conclusão que porque repara, há uma diferença entre palavras. Por exemplo, uma coisa é responsabilidade, outra coisa é culpa. Eu não tinha culpa nenhuma naquilo, mas eu tinha pedido às pessoas para colaborarem e elas tinham dado duro. E, portanto, eu senti me na obrigação de lhes pedir desculpa. E verdade.

JORGE C 00:15:46 Vamos viajar até ao consultório? Ainda continua a ouvir pessoas?

JMV 00:15:50 Continue. Quatro dias por semana.

JORGE C 00:15:53 Isso não é ritmo para alguém que podia estar agora, se calhar a pensar escrever mais livros, fazer mais. Isto é uma escravidão.

JMV 00:16:02 Isto parece uma cabala? Não é? Porque, como sabe, é para meu grande prazer, porque o apresentei aqui no Porto, o Luís Osório escreveu o livro sobre o Manoelzinho, o terrível professor Manuel Sobrinho Simões, e houve alguns movimentos no sentido de a seguir avançar. Eu e os que vêm. Não, não me estava a apetecer aquele tipo de formato. Não é impossível que eu volte a escrever. Mas tem razão, eu tenho pouco tempo. Se calhar também não tenho tanta motivação como isso. Mas eu tenho 74 ou 75, faz quatro dias de consultório por semana e um dia de rádio porque gravo dois programas O amor é e o outro frente é mesmo para falarem. Se bem me lembro. Doutor Almeida Santos, gostava de citar essa frase, que é um bom improviso. Dá muito trabalho a preparar.

JORGE C 00:16:56 Portanto, há que pensar, há que escrever umas notas a cada coisa.

JMV 00:16:59 O Tiago, o Miguel, mandou um mail e dizem me a mim e ao Manuel vocês gostariam de falar disto ou daquilo? Manuel, diz lá isto nem pensar. Ou eu digo isto não sei nada que é uma óptima razão para não falar. Depois é preciso chegar a um acordo e nessa altura é preciso ir para os artigos, para os jornais, etc. O amor e o amor é muito mais descontraído. É bom não esquecer que o amor tem 20 anos entre o António e entra na mesquita e entre Mademoiselle e Inês. Estamos em 20 anos e portanto aí a coisa é muito mais simples. Quer dizer, e é imprevisível, Imprevisível porque um de nós lê qualquer coisa que lhe interessa, manda o mail ao outro e diz. se falássemos disto. E a maior parte das vezes o outro diz sem problemas. Outras vezes o que acontece é se convidássemos a alguém. A maior parte das vezes não há nenhum problema quanto ao tipo de convidado, Portanto, o amor. E nesse sentido, também somos dois que se conhecem a uma data de tempo.

JMV 00:18:04 É verdade que eu conheço o Manuel, vai para 50 anos, mas somos quatro, porque para nós, para mim e para o Manuel, o Tiago e o Miguel fazem parte do Alfredo.

JORGE C 00:18:16 E portanto é mais difícil. Portanto.

JMV 00:18:18 Há sempre mais uma ideia. Mas depois há uma coisa terrível no olho de frente que é compatibilizar as agendas de quatro. Enquanto eu e a Inês é religioso.

JORGE C 00:18:31 Para que eles já tenham 01h00, já tenham um dia de.

JMV 00:18:33 Feira àquela hora tal, se houver. De vez em quando há uma impossibilidade e o outro avisa com uma semana de antecedência e adianta se 01h00. Bom, o Old Friends é o caos absoluto. Nós já gravámos a noite porque não havia outra hipótese. Pronto.

JORGE C 00:18:47 Então as agendas estão assim tão complicadas?

JMV 00:18:52 Ouça, se tiver preguiça de ir para a selva amazónica e portanto lhe apetecer qualquer coisa de mais prosaico, próximo e fácil, eu levo. Numa visita guiada à agenda do Professor Sobrinho Simões.

JORGE C 00:19:07 É caótica.

JMV 00:19:07 É o caos.

JORGE C 00:19:08 Eu sei que se tem que mandar lhe um e-mail.

JORGE C 00:19:10 Depois ele responde Está a planear a sua vida lá para para Junho do próximo ano ou para Setembro do próximo ano.

JMV 00:19:15 Tudo não é pronto. A minha é um bocado melhor, mas também não é propriamente famosa. E depois nós temos dois profissionais da área que é o Tiago e o Miguel. Veja, por exemplo basta o Miguel passar dos noticiários da manhã para a tarde e já.

JORGE C 00:19:31 Lá foi um bloco.

JMV 00:19:32 Isto é uma reorganização total porque o desgraçado levantou se às cinco e tal da manhã ou às seis e portanto chegou uma altura que até um certo momento está a trabalhar. A partir daí, coitado, passa. O exagero está quase em coma. Portanto, é preciso levar essas coisas também em conta. O que é que diria um.

JORGE C 00:19:50 Psicanalista de duas pessoas? Eu sei, eu sei. Mas um Freud desta vida que, olhando para a agenda de duas pessoas ou de uma pessoa que está aqui à minha frente, estabelecida, que já fez, já fez muito na vida, que ainda precisa de ter uma agenda tão, tão complicada, em vez de fugir, lá para, para para canto, lanche lá para o sítio onde estão.

JMV 00:20:13 Sexta feira já lá estarei. E se é curioso, sabe porque? Por exemplo, este ano o meu curso fez 50 anos e, portanto houve as adequadas e inevitáveis festividades aqui no Porto, aqui no Porto, E houve vários colegas meus que me disseram tu ainda trabalhas? E eu fiquei varado com a pergunta porque para mim é muito complicado. E aí o Manuel é igual a mim ou pior? Para mim é muito complicado imaginar, mas não trabalhar. Significa isto que a minha música e os meus livros não me ocupariam horas de puro deleite, seguramente.

JORGE C 00:20:53 Eu sei, é uma necessidade ou é uma pré programação?

JMV 00:20:57 E a outra coisa é que eu ainda tenho prazer em trabalhar, porque aquilo que eu faço, sobretudo psicoterapia, eu não consigo imaginar a ser feita como uma obrigação.

JORGE C 00:21:09 Como é que é um dia típico de não sei.

JMV 00:21:11 Aí varia a.

JORGE C 00:21:12 Hora. A hora das pessoas ainda têm 50 minutos.

JMV 00:21:16 À hora dos system, de 45 e 01h00. Pronto. Mas por exemplo, a que horas isso varia? Eu gosto de funcionar de manhã de maneira a meio da tarde estar livre.

JMV 00:21:28 Tenho colegas meus que é exatamente o oposto. Isso também tem a ver com a organização dos dias, não é? Mas há uma coisa que sempre me aconteceu, mas agora me acontece de uma forma mais premente, diria eu, que é a minha profissão antes de tudo o resto é ouvir.

JORGE C 00:21:50 Como é que se ouvem pessoas.

JMV 00:21:53 Ainda estou a aprender. Acho que sei mais do que sabia há 40 anos.

JORGE C 00:21:58 Mas deve haver uma estética. Sim ou não? O Livro Secreto de Júlio Machado Vaz, como a arte, a arte da pergunta ou até a arte da pergunta.

JMV 00:22:08 Não estou a falar da escuta. A arte.

JORGE C 00:22:09 Da escuta. Pois é.

JMV 00:22:11 Pois é. É curioso que no sexo dos anjos eu escrevi que que a vida e a psiquiatria, que são a arte a distância, é e continua a acreditar nisso. Por que é que eu lhe disse que aqui há uma variação? Porque eu sempre fui assim. Mas hoje, como seria lógico, isso tornou se mais evidente. Eu não consigo fazer mais que seis consultas seguidas depois.

JORGE C 00:22:39 Só que é um cansaço.

JMV 00:22:40 E um cansaço e eu posso estar lá, mas não estou.

JORGE C 00:22:45 Não está disponível.

JMV 00:22:46 Estou disponível para a escuta, como acho que tenho a obrigação de estar. Aquelas pessoas foram em busca de ajuda. Por que é que eu estou a dizer? No fundo, cada um é como é. Eu tenho colegas meus que são capazes de fazer dez ou 12 consultas, mas cada um de nós é diferente.

JORGE C 00:23:03 E essas consultas normalmente são consultas regulares. As pessoas voltam ao fim de algum tempo e faz se um trabalho ao longo deste tempo.

JMV 00:23:09 Sim, sim, o que varia muito a pessoas com uma vez por mês. Há pessoas que vão de 15 em 15 dias. O que é que.

JORGE C 00:23:15 As pessoas se queixam?

JMV 00:23:17 Olhe, primeiro um ponto de ordem que é Eu não faço psiquiatria pesada, leia se as psicoses, etc. Portanto, grande parte das vezes eu estou a falar com pessoas que se vão queixar, entre aspas, de maleitas psicológicas, muitas das quais eu já passei por elas.

JMV 00:23:38 Por exemplo.

JORGE C 00:23:39 Isso é importante para ter sentido na pele.

JMV 00:23:42 Eu preferia não ter passado.

JORGE C 00:23:44 Mas já lá está.

JMV 00:23:45 Passei. Tenho que admitir que as vezes, não poucas, foi uma vantagem, nomeadamente o facto de eu ter passado por uma depressão. O meu bom amigo Carlos Amaral Dias dizia Eu aprendi muito com o meu AVC, mas dispensava bem. Eu cito isso para a minha depressão. Eu aprendi muito tendo estado deprimido, mas tinha dispensado a minha depressão.

JORGE C 00:24:11 Durou quanto tempo Esse?

JMV 00:24:13 Estive bastante em baixo. Cerca de três anos.

JORGE C 00:24:17 Três anos. Sim.

JMV 00:24:19 À volta dos 30.

JORGE C 00:24:21 Que é que é um tempo?

JMV 00:24:22 Isto foi a altura em que fui para o divã por necessidade. Não é porque às vezes, naquela altura, hoje em dia creio que já não. Mas naquela altura havia alguns de nós. Todos nós temos o nosso narcisismo. E alguns de nós iam para o divã, mas não diziam que precisavam. Diziam que iam para aprender.

JORGE C 00:24:40 Era um charme. Ficava bem, ficava bem.

JMV 00:24:43 Aliás, a psicanálise nessa altura.

JMV 00:24:46 Estou disponível para que discordem de mim. Eu acho que a psicanálise, nessa altura, tinha muito mais poder em Portugal do que tem hoje e, portanto, ser psicanálise podia contar até no futuro profissional das pessoas. Eu não. Eu disse sempre a toda a gente. Eu fui para lá porque precisava.

JORGE C 00:25:01 A mim dói me e, portanto, estou.

JMV 00:25:03 Num oito, não é? Aliás, como o meu patrão da altura, o Eurico Figueiredo disse sempre fizeste muito bem, foste para lá a quatro e saíste lá. Pelo menos a três já foi melhor. E, portanto, eu nunca deixo de expressar a minha gratidão pelo Dr. José Milheiro, que é um bom amigo hoje em dia. Faz parte da nossa da nossa tertúlia na Ordem dos Médicos, com o Professor Sobrinho Simões, com o Dr. António Lopes, etc. E que foi o meu psicanalista.

JORGE C 00:25:33 O que há tanto para dizer durante durante semanas ou meses de de conversa, Ações.

JMV 00:25:40 Em que há um silêncio absoluto e eu garanto lhe que os psicanalistas não são muito useiros e vezeiros de interromper o silêncio.

JORGE C 00:25:50 Deixa estar.

JMV 00:25:51 Deixa que estão atrás de nós. É uma profunda solidão e uma profunda solidão.

JORGE C 00:25:57 Portanto, estamos deitados?

JMV 00:25:58 Estamos, sim. E a cura, tipo de.

JORGE C 00:26:00 Freud, está aqui. Ele está aqui, nas nossas costas.

JMV 00:26:03 Pronto.

JORGE C 00:26:05 O silêncio não dói às pessoas.

JMV 00:26:06 Quando o silêncio se quiser. E é das coisas mais fascinantes na minha profissão e na vida em geral. Porque há todo o tipo de silêncios. Há silêncios que são angustiantes, muito mais angustiantes. Qualquer palavra. E, por outro lado, há silêncios que têm o conforto que nenhuma palavra pode dar.

JORGE C 00:26:30 Pode ser um silêncio com os nossos amigos mais próximos. É só um silêncio bom, não é?

JMV 00:26:33 Tem a sensação que tudo está certo. Não são precisas palavras sequer.

JORGE C 00:26:39 É outro silêncio. É o silêncio de eu não sei o que é que hei de dizer mais a esta pessoa que aqui está. Eu até podia dizer qualquer coisa, mas estou aqui a falar do terapeuta. Não, não, não estou a falar do desgraçado que está no divã.

JMV 00:26:51 O desgraçado que está no divã muitas vezes tem dificuldade até em expressar aquilo que sente. Basta dizer lhe isto. Quando eu fui para psicanálise ao fim de três meses. Eu lembro me de comentar. Com amigos, com a minha ex mulher, etc. De comentar e dizer assim Mas isto é um masoquismo, isto é caro Eu estou lá há três meses e estou pior do que quando entrei, o que era verdade. E estava pior porque.

JORGE C 00:27:30 Estava a mexer na dor.

JMV 00:27:31 Estava a mexer em coisas que para mim estavam arrumadas da forma como convinha, o que o Jorge já cá estava a chamar a atenção. Ou seja, eu fui para o divã e eu reconhecia que precisava fazer qualquer coisa. Podia não ter feito aquilo. Podia ter recorrido só a antidepressivos e não ter feito psicoterapia nenhum. Pronto, eu decidi que ia para o caminho mais difícil. Não estou a dizer sequer isso, mas eu. Eu precisava de entender e pensava não tenho nada contra as pastilhas. Se melhorarem, óptimo. Mas isso não basta.

JMV 00:28:07 Eu tenho que entender o que se está a passar comigo. Pronto. E fui. Mas fui e não sou o único com uma perspetiva do que estava a acontecer na minha vida, que era assim. Os astros estão alinhados contra mim. Há muitas pessoas que cujo divertimento é fazer a minha vida no inferno. Eu sou um tipo azarado por ser uma vítima.

JORGE C 00:28:35 Estão me a lixar a minha vida e eu sou a vítima inocente que aqui está, que não tenho nenhuma quota parte de nenhuma responsabilidade nesta conversa.

JMV 00:28:44 Ao fim de três meses eu tinha percebido que não estou a dizer que a minha volta fosse em todos os Santos. Não estou a dizer que não tivesse havido aqui e acolá um passo em falso, sem responsabilidade nenhuma, mas que basicamente eu tinha metido num poço pelo meu pé e dentro do poço ainda tinha mergulhado na água, ainda estava mais fundo. O que é irritante que é? Você está a tentar sentir se melhor, Pelo contrário, está se a sentir pior. Aquilo é caro. Você pelo menos tenta rir se quando diz à sua mulher nessa altura.

JMV 00:29:23 Não, nós ao fim de semana, agora só podemos ir à tasquinhas, que não há dinheiro para restaurantes bons, etc. Uma pessoa diz Mas o que é isto?

JORGE C 00:29:31 Porque é que alguém se submete a esse aqui em.

JMV 00:29:34 Vez de ir embora?

JORGE C 00:29:35 Sofrimento inútil? Aparentemente não é.

JMV 00:29:37 Não foi.

JORGE C 00:29:38 Inútil.

JMV 00:29:38 Não foi, Não foi. Porque depois eu comecei a ir ao osso e a começar a falar verdadeiramente de coisas, algumas das quais eu nem sequer pressentia. E a pouco e pouco eu fui voltando à superfície.

JORGE C 00:29:54 Mas isso parece me uma espécie de arqueologia da nossa mente, da maneira como.

JMV 00:29:59 Não quero ser injusto, porque aplicar a palavra arqueologia pode reenviar nos para uma visão da psicanálise. De tudo isto tem a ver com a infância e ficamos completamente marcados e depois não acontece e não tem importância. Não é.

JORGE C 00:30:14 Assim. Nós estamos sempre a reconstruir nos e a ver o que é que, como é que estamos, como é que nos sentimos, como é que, sei lá.

JMV 00:30:21 Vou lhe dar um exemplo.

JMV 00:30:22 A vida, inevitavelmente, é um trajeto cheio de lutos, de lutos, de gente que morre e de lutos que gente que não morre. O que não quer dizer que sejam muito mais fáceis. Às vezes são até mais difíceis.

JORGE C 00:30:35 Pessoas que nós perdemos emocionalmente, gente que.

JMV 00:30:38 Perdemos, que nos desiludiu ou a quem nós desiludimos. Amizades que se desfazem, etc. E tudo isso são lutos. Depois, as dificuldades normais da nossa vida, que não é propriamente simples. E isso significa que muitas vezes nós descobrimos que temos padrões de comportamento para lidar com a frustração, para lidar com o desejo, etc.

JORGE C 00:31:07 Aprendemos isso onde? Onde é que aprendemos.

JMV 00:31:10 Isso Com os outros? Com a maneira como crescemos? Como vimos os outros funcionar? Aprendemos isso com os nossos próprios comportamentos, que às vezes, quando éramos putos, permitam a expressão, eram maneiras adequadas de reagir. Mas não. Aos 20 e tal, aos 30 e tal.

JORGE C 00:31:27 Anos, voltamos à infância e lá está.

JMV 00:31:29 Não é voltar sequer. Às vezes é manter padrões de comportamento que na criança são mecanismos de defesa, quais? Inevitáveis.

JMV 00:31:39 A criança vive numa floresta de joelhos e nós somos assim. E a criança está aqui. E a criança tem as suas teorias quanto ao que acontece e que acontece. A criança tem uma intuição brutal. A criança não sabe muitas vezes o que está a acontecer, mas sabe. Muitas vezes antes de nós lemos que as coisas não estão bem e tem de se adaptar e manipula. O meu querido amigo Octávio Cunha dizia aos pais quando eles apareciam com com os bebés Agora apareceu lá em vossa casa o maior manipulador da história. E é verdade, as crianças têm as suas armas também e de vez em quando isto de uma forma simplista, quero deixar bem claro. De vez em quando nós descobrimos, já adultos, que temos formas de funcionar, que são formas infantis.

JORGE C 00:32:30 E que não é, que não ultrapassamos e que não.

JMV 00:32:32 Funcionam. Depois já não funcionam, já não funcionam e que nós ficamos muito frustrados com aquilo. E a maneira mais simples é, consciente ou inconscientemente, culpar os outros, culpar o. O boletim meteorológico para o que quiser, não é? Portanto, em mim, o facto de, numa determinada altura, de uma forma simbólica, naquele naquele divã, com aquele quadro que eu nunca esquecerei à frente que.

JORGE C 00:32:57 Estava lá à.

JMV 00:32:57 Frente. Mas fazer daquele quadro um espelho e dizer mas espera aí, Julho, a que coisas? Que foste tu que escolheste? E, portanto, tens que assumir a responsabilidade e tens que mudar comportamentos, porque se continuares com o mesmo tipo de comportamentos, os resultados vão ser os mesmos. Nós temos essa nostalgia, não é? Eu faço as mesmas coisas, mas o resultado vai ser diferente, mas não vai.

JORGE C 00:33:24 Mas as pessoas mudam intrinsecamente. As pessoas.

JMV 00:33:28 Mudam. Não é fácil. Agora há mudanças e mudanças, sei lá. Há bocado eu disse lhe e isso foi, penso eu, qualquer coisa de que foi acontecendo. Eu estava lhe a dizer há 20 ou 30 anos havia coisas que para mim podiam ter muito importância e que hoje, pronto, eu não lembraria no dia seguinte. Isso é um tipo de mudança, tem a ver com o decorrer da vida com nós. Desejavelmente, isto pode ser como é que se diz wishfull thinking, não é? Mas nós adquirirmos alguma sageza, etc.

JMV 00:34:04 Experiência, experiência, outras vezes mudamos de outras formas. Supõe uma relação, uma relação. A palavra não é muito agradável de empregar, mas uma relação que se projeta no futuro. E eu não gosto nada de certas vozes que dizem Ah, não! Hoje em dia isto é tudo terrivelmente superficial. E hoje, uma pessoa, amanhã ou outra e tal, não é isso que eu encontro no consultório.

JORGE C 00:34:32 Portanto, há pessoas.

JMV 00:34:33 Que pessoas continuam com a nostalgia que as relações de incerto.

JORGE C 00:34:37 E investem nisso.

JMV 00:34:38 E investem nisso. Mas muitas vezes nós temos que assumir que uma relação que ainda por cima se projeta no futuro é uma negociação permanente.

JORGE C 00:34:48 E que há visões diferentes daquilo o caminho.

JMV 00:34:51 Se há visões diferentes, é preciso ser negociado um caminho. Se quisermos voltar à matemática, que seja uma bissetriz. Ou então aquela relação rígida e fica. E há alguém que domina a relação e alguém quer dominar. Não é uma boa ideia. Normalmente porque relações rígidas quando quebram, quebram mesmo.

JORGE C 00:35:15 Entre as outras. De outro lado, que são tão competitivas que que que que podem estar.

JORGE C 00:35:20 Eu estou a falar.

JMV 00:35:21 Das outras que são adaptáveis.

JORGE C 00:35:22 Às adaptáveis.

JMV 00:35:23 Sim, Em que, por exemplo, Veja, nós estamos. Isto é muito importante para a medicina. A medicina viveu, e bem, um paradigma que era o paradigma das doenças infecciosas, ou seja, aparecia uma doença. Nós identificávamos nós um psiquiatra, a dizer isto, como compreende? Nós identificávamos o bichinho, escolhíamos a droga que matava o bichinho, a droga matava o bichinho, os sintomas desapareciam.

JORGE C 00:35:52 Ou então o bicho era demasiado forte e o bichinho matava o.

JMV 00:35:55 Íamos nós. Pronto, isso acontece ainda. Mas pronto, os antibióticos são um exemplo típico disso. Hoje, com o aumento de longevidade, nós estamos num paradigma que não substitui este. Tivemos uma cura de humildade com.

JORGE C 00:36:13 A pandemia, o pequeno vírus que nos deu cabo da vida durante dois anos, pelo menos.

JMV 00:36:18 Mas é uma sociedade que acima de tudo, tem vindo a deparar se com as doenças crónicas. Aquilo que o povo. Quando eu fazia consulta em Matosinhos e em Gaia, recém formado, me dizia ao sôtor estas só com banhos, terra fria ou não matam mas moem.

JMV 00:36:39 É exactamente isso. São doenças crónicas. As dores.

JORGE C 00:36:41 Nas cruzes, essas coisas.

JMV 00:36:42 Todas que são ainda por cima.

JORGE C 00:36:45 As maleitas da.

JMV 00:36:46 Idade, as maleitas da idade que são ainda por cima muito ameaçadoras para o narcisismo do técnico de saúde, porque ele tapa um buraco ali e no mês seguinte a pessoa vem a queixar se outra coisa e a pessoa de repente diz mas eu não consigo verdadeiramente decorar, Pois não é isto. É o paradigma do cuidar.

JORGE C 00:37:07 Mas isso é uma ilusão dos médicos acharem que conseguem curar tudo e salvar toda a gente a todo o momento. Ou não?

JMV 00:37:15 Até certo ponto sim. E digo lhe isso com pena. E sabe porquê? Estão ali já de responsabilidades, porque eu próprio fui professor.

JORGE C 00:37:24 De antropologia médica. Não é tentar perceber como é que os médicos se fizeram ao longo da história do tempo.

JMV 00:37:28 É que a formação dos médicos foi sempre muito feita no paradigma do curar.

JORGE C 00:37:36 Eu vou lá, eu intervenho, eu resgato.

JMV 00:37:39 O que às vezes transformava o o corpo e a mente também, mas sobretudo o corpo do doente num campo de batalha entre os médicos e a morte ou deformidade, ou fosse o que fosse.

JMV 00:37:58 E aqui esquece quais a pessoa.

JORGE C 00:38:01 Fazendo tudo o que há para fazer e.

JMV 00:38:02 Nós, os médicos e a medicina não luta contra a doença. A medicina debruça se sobre uma pessoa que está doente. Isto pode parecer sinónimo, mas não é verdade, porque, por exemplo, nenhum de nós está doente da mesma maneira, com a mesma doença.

JORGE C 00:38:19 Portanto, não é a doença e a pessoa que está.

JMV 00:38:22 Doente, ou seja, a doença X. Se nós pensarmos nela como aprendemos nos velhos calhamaços, corremos o risco de nos metermos num beco sem saída. Que é se a doença é aquela extrema chamada visão essencialista, se é sempre aquela. O tratamento é sempre o mesmo.

JORGE C 00:38:45 Então não é preciso. O médico também quase não é. O problema é.

JMV 00:38:47 Que os doentes são todos diferentes.

JORGE C 00:38:49 Têm sensações diferentes, têm vidas diferentes, têm corpos diferentes, tudo.

JMV 00:38:54 E nós tratamos. E pessoas não é doença.

JORGE C 00:38:56 Então e como é que e como é que os médicos lidam então com essa coisa que é tentar fazer tudo a todo o momento, a toda a hora, com todas as armas, incluindo as nucleares, para tentar salvar aquela pessoa desde logo.

JMV 00:39:10 E isso é importante para nós, médicos, na formação dos médicos, porque no passado essa noção não era inculcada nos jovens médicos. Desde logo, estamos a falar de profissionais de saúde e não apenas médicos. Vamos falar de trabalho, de equipa.

JORGE C 00:39:27 Há uma equipa.

JMV 00:39:27 Pronto, mas isso não é linear. Muitas vezes. Os médicos foram formados, por exemplo, para trabalhar em equipa, com uma condição que é também trabalhamos em equipa, mas o chefe de equipa sou eu. Bom, mas é que há muitas situações em que aquilo que se nos depara é melhor que quem lidera a equipa. Não seja um médico e.

JORGE C 00:39:53 Seja um enfermeiro até, quiçá um assistente social, o que for.

JMV 00:39:56 Pois a prescrição social que é um exemplo típico. Jorge trabalha numa área em que aparecem não sei quantos idosos com doenças pulmonares. Jorge conhece o sítio onde eles moram? Sim, e a umidade escorre pelas paredes. Jorge pensa assim Eu aceito o antibiótico, mas não resolve nada.

JORGE C 00:40:20 A questão está na casa. A questão está nas questões sociais.

JMV 00:40:22 Claro. Ou seja, aqui a saúde, qual, aliás, como Organização Mundial de Saúde, está sempre a repetir. A saúde não é demasiado importante e é A urgência mundial de saúde. Pede nos falem mais da saúde e menos da doença. A saúde é demasiado importante e demasiado complexa para ser deixada nas mãos do Ministério da Saúde. Tem que ser muito mais gente a tratar das coisas. Isso é importante. Mas voltando lá atrás, depois queixa se de mim. Estava eu a falar da relação, o cuidar na relação, numa relação maleável. Suponhamos que alguém tem um período mais em baixo, o outro assume um estatuto de mais cuidador e na semana seguinte ou no mês seguinte, invertem se as posições. Este tipo de relação é muitíssimo mais resistente a todos os traumatismos da vida quotidiana do que uma que é perfeitamente rígida.

JORGE C 00:41:18 E porque é que não é sempre assim, com essa flexibilidade, com essa maleabilidade?

JMV 00:41:22 Porque nós humanos, somos animais, digamos assim. O Manoel diria imediatamente porque nós somos rascas. Ou seja, por exemplo, com muita frequência mesmo de uma forma inconsciente, se numa relação uma pessoa tem uma um ascendente sobre o outro, tem no fundo poder sobre o outro.

JMV 00:41:51 Não abre mão desse poder com facilidade. Ora esta! Este equilíbrio pressupõe. Vou empregar o termo sem nenhuma conotação psiquiátrica, como os meus netos o enxergariam. Não pode haver paranóias de adormecer, dominar ou dominar. Na relação, em princípio, devemos estar ombro a ombro, duas liberdades e olhar no mesmo sentido.

JORGE C 00:42:17 Curiosamente, depois. Quer dizer, não quero colocar isto no binário homem e mulher, porque sabemos que o mundo agora tem múltiplas configurações e há formas diferentes, lá está, de exercer essa tal flexibilidade ou inflexibilidade. Conforme. Sim, desde de uma forma mais classicamente masculina de tomar decisões, de ir para a frente. É uma fórmula mais feminina. De uma maneira que é eu vou levar a minha água ao seu moinho e vou arranjar maneira de que isto chegue lá da mesma maneira.

JMV 00:42:46 Permita me que pegue exactamente na sua imagem, não só por preguiça minha que é lendária, mas porque a imagem é magnífica. Repare nisto. Isso é o estereótipo em que não estou a dizer que o Jorge é da minha idade.

JORGE C 00:43:01 Vou ser crucificado?

JMV 00:43:02 Não, não. Mas a minha geração foi toda educada nesse estereótipo. Os homens são mais activos, mais racionais, mais isso, mas aquilo. Estão sobretudo na esfera pública. As mulheres são mais sensíveis, mais amorosas, melhores cuidadoras e estão na esfera privada. Quer se queira quer não, isto é meter as pessoas, neste caso os dois sexos, se quiser. Depois vamos à questão do binário não binário. Estamos a meter o sexo em gavetas, ou seja, a limitá los. Tem toda a razão. Vou lhe dar um exemplo. Veja o que mudaram os homens. Mesmo assim alguém poderá dizer não tanto como seria desejável, mas mudaram na sua relação. Agora até vamos tirar a questão de do casal heterossexual e falar nos filhos. A relação hoje em dia do pai do homem é infinitamente mais próxima. Em geral, com todas as exceções que ambos conhecemos, do que há 30, 40, 50 anos atrás. E nós podemos dizer assim ainda bem para os miúdos. E temos razão, mas também ainda bem para os pais, porque estes homens descobriram em si dimensões de afectividade que antes lhes eram praticamente proibidas.

JMV 00:44:23 Quer dizer, nós éramos educados para ser cópias rascas do John Wayne, Fortes e Brutos, não é? O João não é, não, dizia 1A1 das heroínas que amava. Ela adivinhava que ele a amava e, portanto, no fim, ela punha um prato na mesa e ele, sem dizer nada, ficava, aparecia dizendo. E a malta percebia que eles iam casar, mas ele não tinha aberto o bico. Então os homens eram.

JORGE C 00:44:51 Assim apesar de tudo. Então coitados, coitada da nossa espécie e dos homens que têm que fazer aqui um aqui, um caminho, e que esse caminho também não é ornamento?

JMV 00:45:01 Sim, sim, mas os homens mudaram, mas mudaram com vantagens para eles agora.

JORGE C 00:45:05 Vantagens emocionais também.

JMV 00:45:06 Mentais. Emocionais. Agora, não sejamos, não sejamos líricos na questão do poder, muito do mundo masculino só mudou pela pressão que veio. E agora o cuidado de parte do mundo feminino, porque os feminismos não esgotavam o universo feminino. Havia mulheres que muitas vezes tinham ataques. Estou a falar de coisas verbais e escritas, etc.

JMV 00:45:37 Muito mais furibundos as feministas que os próprios homens que eram mulheres, a quem o patriarcado puro e duro convinha.

JORGE C 00:45:46 Lá estava o padrão.

JMV 00:45:47 Pronto estava o padrão. Agora, o que é que você verifica hoje em dia? Verifica, por exemplo, nas nas tarefas. Mas ele fica sempre zangado comigo por dizer isto. Mas pronto, é assim. Tenho muita pena, mas só o meu filho mais velho quer casar, por isso o meu filho mais velho é casado e eu vi o sempre. Agora repare no verbo que eu vou utilizar e ouvi o sempre partilhar todas as tarefas de casa com a minha nora. Nem ela admitiria outra coisa. E eu nunca fiz isso. E eu digo partilhar. E isto diverte me sempre muito, porque nós, homens em geral, sobretudo os da minha geração, ficamos maravilhados com outro verbo que é ajudar. Quando nós dizemos eu ajudo. Só falta darmos uma volta ao estádio e receber os aplausos. E algumas mulheres. E eu compreendo. Ajudam nos nisso porque dizem ah, ele ajuda muito lá em casa.

JMV 00:46:46 Eu compreendo, Não tem mal nenhum. É semântica, mas traduz outra coisa. Nós, em teoria, não devíamos ajudar.

JORGE C 00:46:53 Não é equitativo.

JMV 00:46:53 Não é a casa, não é dos dois, os filhos não são dos dois. Então devia se partilhar tarefas, não era?

JORGE C 00:46:59 Posso fazer uma declaração machista.

JMV 00:47:01 À vontade.

JORGE C 00:47:02 Quando nasce a criancinha, a mamã agarra a criancinha e diz Calma, que isto aqui agora sou eu, que pelo menos nos primeiros dias, nos primeiros tempos, a minha criancinha sim.

JMV 00:47:12 Mas quer dizer, não.

JORGE C 00:47:14 Vamos ajudar a dar o banho.

JMV 00:47:15 Mas claro está, mas queremos dar o banho, mudar fralda.

JORGE C 00:47:20 Incompetente para fazer isto.

JMV 00:47:21 Não estou a dizer que os homens têm que aprender a dar de mamar, que eles podem aprender, mas não funciona. A biologia.

JORGE C 00:47:28 Não é a biologia.

JMV 00:47:30 E pronto. A biologia não é agora tudo o resto, porque reparaste Tudos magníficos? Eu acho uma perfeita delícia, Porque. Os estereótipos desagregam se, vão, digamos assim, vão se matizando.

JMV 00:47:49 Mas. sobrevivem às vezes em pequenas coisas que, quando obrigadas, são até divertidas, que é de vez em quando pega se em casais e eles concordam que partilham as tarefas. Portanto, isso é um dado adquirido. E depois nós perguntamos.

JORGE C 00:48:10 Vai fazer uma lista?

JMV 00:48:11 Faça uma lista. E sabe como é que aparece uma sobrevivência de estereótipo e assim ele paga os seguros. Ele faz a revisão do carro tal, tal, tal, tal. Quase tudo o que tem a ver com os miúdos. E ela. Ele está a partilhar tarefas. Mas quais tarefas? Tarefas que subconscientemente são consideradas mais masculinas, enquanto as mais femininas que têm sempre relação com o cuidar? Hoje há alturas houve em que a filha mais nova de um casamento sabia que não ia casar porque ia tomar conta dos pais quando eles fossem velhos.

JORGE C 00:48:45 Esse mundo mudou. Agora as mulheres vão tomar conta disto.

JMV 00:48:56 Queria pegar naquele exemplo que disse porque é muito bonito, se disse e as mulheres dão a volta à coisa no estereótipo clássico. Seria uma ingenuidade dizer que as mulheres não tinham poder nenhum.

JORGE C 00:49:11 O poder de influência é um poder.

JMV 00:49:13 E, sem dúvida nenhuma e muitas vezes. Seja em termos gerais, seja os próprios homens, quando se sentem pressionados, diziam assim. Mas no fundo, elas acabam sempre fazer o que querem. Sempre. Pode ser um exagero. Muitas vezes estou aqui para dizer sim, senhor. Era verdade e é verdade. Mas isso não resolve o problema, porque muitas vezes, o que é que acontecia àquela mulher, naquela relação heterossexual? Conseguia obter o que queria. Porquê? Porque dava a volta a aquele homem. Você pode me dizer assim, Mas o resultado final era o que ela queria. Mas o trajeto para lá não é um trajeto democrático e equitativo.

JORGE C 00:50:06 Era sinuoso porque ela.

JMV 00:50:07 Não podia olhar nos olhos e dizer assim Eu acho que era melhor fazermos assim. Não. Ela ia eventualmente deixando uma semente aqui, outra acolá e tal e até acontecia. O que devo lhe dizer? Visto de fora, é divertidíssimo que passado algum tempo aquele homem dizia vamos fazer isto assim, assim, convencido que ele tinha decidido quando ela é que tinha semeado tudo.

JMV 00:50:28 Mas isso não é uma relação equitativa.

JORGE C 00:50:32 Nós estamos praticamente a terminar esta conversa. É saborosa e iria por por aí fora que quero voltar à medicina e à a é a fronteira com a técnica que é. Estão aí as inteligências artificiais ou ditas inteligências artificiais, com máquinas com capacidade de aprender que tecnicamente podem começar a fazer coisas, já estão a fazer umas coisas melhores que os seres humanos. Então e agora? Como é que. Como é que é a medicina? Como é que é o novo médico que aí vem?

JMV 00:50:58 Bom, se quiser, suponhamos que estamos a fazer isto mesmo ao fim da tarde. E eu e o Jorge já estávamos mas era ansiosos por ir para Matosinhos comer um peixe. Eu dizia lhe assim Olha, estou me nas tintas porque isso na psiquiatria não é assim tão fácil. Mas não, eu sou professor de antropologia médica. O tema é fascinante. Primeiro, a inteligência artificial. Pode ser e é de uma utilidade brutal, não só nas questões, digamos assim, mais tecnológicas, mas hoje.

JMV 00:51:35 Daquilo que eu leio não é a minha especialidade, mas por exemplo, em radiologia, em anatomia, patologia, etc. A máquina.

JORGE C 00:51:43 Já vê melhor, a.

JMV 00:51:43 Máquina vê melhor, sobretudo com a capacidade que tem de utilizar os dados de uma forma que nós não somos capazes. Vai à procura.

JORGE C 00:51:55 Dos micro padrões e vai conseguir dizer aqui há uma possibilidade de que possa acontecer uma coisa e viver muito mais cedo do que nós.

JMV 00:52:03 Mas para lhe falar com toda a franqueza, mas aqui é a formação profissional do professor de antropologia médica. Aquilo que me alegra e que me enche de esperança na inteligência artificial É algo de muito mais primitivo a montante, nos profissionais de saúde. A relação profissional de saúde pessoa que vem pedir ajuda pode ser extraordinariamente facilitada pela inteligência artificial. Vou lhe dizer rapidamente porquê hoje as pessoas chegam ao meu consultório e, inevitavelmente falam de seu estado físico, também da sua saúde física. Nós temos, por exemplo, ainda essa essa maleita da análise, que é separar muito o psicológico e o físico, sendo o físico mais, o mais mais honesto e respeitável.

JMV 00:52:57 Por exemplo, uma discriminação que não terminou. E dentro da própria medicina, a psiquiatria continua a ser olhada de lado.

JORGE C 00:53:04 Se me doer a perna e uma perna, se me doer a alma, uma perna.

JMV 00:53:08 Partida, ninguém discute.

JORGE C 00:53:09 Está aqui uma perna partida. Pronto.

JMV 00:53:11 Uma neurose grave. Alguém diz que há exagero ali, não sei quê e tal e tal e tal e tal. E isto inclusivamente levar nos ia longe, porque neste momento preocupa me na psiquiatria um certo movimento de alguns colegas se refugiarem na prescrição e depois dizerem às pessoas uma coisa que é bem intencionada, mas que deixa, na minha opinião, mal colocada, a psiquiatria. Quer dizer, e agora vou lhe dar um nome de um psicólogo porque faz lhe bem falar com alguém. Se o psiquiatra não fala com as pessoas, então isto não é psiquiatria, é simplesmente estar a receitar. O que é que eu lhe ia dizer? As pessoas chegam lá e dizem assim O senhor quer ver as minhas análises. Por exemplo, eu só tenho consulta daqui não sei o quê.

JMV 00:54:02 Deixa me tal está à vista. E falam. E cada vez mais eu oiço isto. Eu gosto muito do meu médico de família ou da minha médica. Os que têm. Há 1 milhão e não sei quantos que não têm. Enfim, coisas tristes. Mas sabe de uma coisa? Eu agora quase que não o vejo. Eu só vejo a parte de trás do computador.

JORGE C 00:54:28 Está lá no consultório, mas está em casa.

JMV 00:54:31 E eu tenho que lhe dizer assim olha, se calhar vai achar que eu estou a defender o meu sindicato. Mas eu vou lhe dizer uma coisa o meu colega se não preencher aqueles campos todos, está metido numa enrascada.

JORGE C 00:54:45 Porque tem que fazer o registo.

JMV 00:54:46 Tem que fazer aquelas coisas. Bem, a inteligência artificial pode libertar brutalmente o diálogo com o doente ou a pessoa que não está doente, mas vai uma consulta até.

JORGE C 00:54:58 Colocando logo as análises dentro do relatório clínico e aquilo já está feito. Não é preciso travar.

JMV 00:55:02 A conversa catalogando a.

JORGE C 00:55:05 Tensão arterial. Aquilo automaticamente registar, claro.

JMV 00:55:07 Aliás.

JORGE C 00:55:08 Facilitar nos a vida.

JMV 00:55:09 Hoje em dia com coisas destas, não é? Você anda calmamente à beira rio e isto está lhe a mandar tudo para o seu médico, etc.

JORGE C 00:55:16 Depois pode fazer uma interpretação e usar. Lá está a sua inteligência apenas para para ter um contexto para perceber e.

JMV 00:55:21 Portanto isto, digamos assim. Só isto. Não estou a falar sequer do resto. Só isto é uma ajuda verdadeiramente brutal. Mas atenção, porque quando nós falamos de inteligência artificial, de vez em quando falamos de inteligência artificial, como se por trás da inteligência artificial não existissem seres humanos. Os algoritmos foram fabricados.

JORGE C 00:55:47 Podem ser bons.

JMV 00:55:47 Ou maus, podem ser bons ou maus. Porquê? Porque quem os programa o constrói. Enfim, os termos técnicos também está sujeito, por exemplo, a preconceitos.

JORGE C 00:55:57 E a vieses.

JMV 00:55:58 E havia exactamente. Agora veja se o algoritmo honestamente lhe responde que a população negra nos Estados Unidos está em melhor estado de saúde do que a branca.

JORGE C 00:56:12 Suspeito que é uma mentira.

JMV 00:56:14 Olha para aquilo e diz Enlouqueceu.

JMV 00:56:18 Em geral não enlouqueceu. Sabe porque é que ele disse aquilo? Porque foi programado para fazer análises assim. Quem é que vai aos hospitais e internava nos Estados Unidos sem seguro de saúde? Está no mato. Os negros têm muito menos que os brancos. O algoritmo diz Há muito, muito menos internamentos de negros de brancos tão altos. Ou seja, como você diz, o algoritmo quando está enviesado, não é culpa dele. Foi programado dessa maneira.

JORGE C 00:56:50 O que implica que pensemos o algoritmo não só como uma questão técnica, mas também como uma questão. Enfim, política de pensamento da maneira como o algoritmo pode ser feito, não deixemos, não deixemos isto só para os engenheiros.

JMV 00:57:02 O algoritmo pode ser utilizado para nos manipular. Mas só Jorge sabe isso melhor que eu. Saia do campo da saúde. Vá para o Instagram.

JORGE C 00:57:14 Lá está o algoritmo a mostrar aquilo que queremos ver.

JMV 00:57:16 O Jorge três dias seguidos aparece lhe música clássica e o Jorge põe o like. No quinto ou no sexto.

JORGE C 00:57:24 Dia é só música, passe.

JMV 00:57:25 O exagero está.

Speaker 4 00:57:27 À.

JMV 00:57:27 Rasca para encontrar alguma coisa que não seja música clássica? Lá se vai a diversidade. Não é porque você, acima de tudo, é um consumidor e aquilo está programado para o consumidor.

JORGE C 00:57:38 Então vou vender aqui uns discos que tens aqui, já que gostas de música clássica e cá está.

JMV 00:57:43 Percebe? Sei lá. Eu não lhe escondo, por exemplo, que o algoritmo a mim topou me logo e eu levo com tudo o que acontece aos netos dos Beatles, aos filhos dos Beatles, aos Beatles antes de eles serem Beatles, etc. Tudo isso, nesse aspecto, é cego. Agora, há outras questões que depois se levantam, que é em termos profissionais. Como é evidente, a inteligência artificial pode e vai mandar para o desemprego milhões de pessoas que têm que ser recicladas, digamos assim, para o tipo de profissões, os médicos também. Há especialidades que estão muito mais em risco que outras. Mas repare, isso também não começou agora, sei lá.

JORGE C 00:58:27 A robótica na cirurgia, por exemplo.

JMV 00:58:29 Onde era o que eu ia dizer? Eu sou, digamos assim, não um orgulhoso, mas o paciente portador de uma prostatite para aí há 15 anos, quando ela me foi diagnosticado, ninguém me disse se um dia é step a torto e a degenerar. Vamos operar te com um braço robótico. Mas quem é que falava de braço robótico naquela altura?

JORGE C 00:58:56 Talheres e mão de cirurgião não cirurgião?

JMV 00:58:58 Ora, o braço robótico tem uma precisão aparentemente muito maior. abençoada, portanto.

JORGE C 00:59:05 Faz menos estragos e consegue ter uma maior precisão agora. Estando lá, o médico pára para carregar no botão, espero eu.

JMV 00:59:10 Mas agora, depois a outras questões é que a inteligência artificial também se engana, o que é uma coisa estranha, porque nós estamos muito programados para confiar mais nas máquinas que nas pessoas, porque achamos que as máquinas estão ali. Funcionam. Ponto final. Parágrafo.

JORGE C 00:59:29 Quando a máquina se enganar e nós não soubermos onde raio é que ela se enganou e pior, não soubermos em que parafuso é que asneira.

JMV 00:59:37 Até até pode acontecer em aspectos éticos para sairmos da saúde numa determinada altura.

JMV 00:59:46 Um senhor inglês escreveu para o Guardian dizendo que estava a escrever um artigo científico sobre determinado tema. Já não sei qual era e que estava a ter dificuldades em encontrar dois artigos de dois jornalistas do Guardian especializados naquela área. Se o Guardian podia ajudar e o Guardian pediu aos jornalistas que fornecessem, jornalistas disseram Nunca escrevemos estes artigos.

JORGE C 01:00:13 Ou.

JMV 01:00:14 Confusão. Então o que é que tinha acontecido? Ele tinha feito uma busca e o algoritmo tinha sido tão prestável, tão gentil, que lhe tinha dado tudo o que tinha encontrado e, além disso, reescrito ao estilo daqueles dois jornalistas. Passava por serem textos deles? Perfeitamente. Era o estilo deles. Dois artigos que não tinham eles, Só que não existiam.

JORGE C 01:00:41 A falsidade com imagem de verdade.

JMV 01:00:44 Ou seja, o que eles chamam, Se bem me lembro, o algoritmo alucina também. Bem, essas coisas são complicadas. Agora, o que nunca podemos esquecer é o fator humano que há uns meses, penso eu que já são dois meses sem um artigo que pôs toda a gente a discutir.

JMV 01:01:01 Porquê? Porque foram perguntar a doentes? Que respostas é que eram mais adequadas para eles? E esses respostas eram dadas para o algoritmo e X por médicos humanos. Porque agora já já há agentes externos, artigos médicos, humanos com médicos não humanos. Pronto. E os algoritmos ganharam. E a primeira interpretação foi Epa! Isto mostra que eles são melhores do que nós. E depois pensou assim Espera aí. E se pensarmos ao contrário? Terão sido estes médicos recentemente empáticos? Como é que uma máquina é mais empática do que uma pessoa? Se calhar estes médicos estavam no fim do turno, chateados ou isto ou aquilo e podiam ter feito melhor porque disse que estávamos no fim. Se calhar é uma boa maneira de acabarmos.

JORGE C 01:02:03 Empatia e empatia é sempre uma boa forma de.

JMV 01:02:06 Empatia. Vamos ver. Aliás, ainda outro dia eu e o meu filho mais novo nos divertíamos porque o chat PT ensinavam nos boas maneiras. E ele pôs uma terminada questão, não é? E pronto. Chat pt acho esta maneira de perguntar um bocado seca e rude como é que eu poderia perguntar este é o chat PT respondeu Olhe, pergunte desta maneira, assim, assim, assim, assim E como era uma coisa médica, no fim dele dizia mas.

JMV 01:02:44 Embora lhe tenha dado a minha opinião, etc, etc, aconselho a visitar um médico e pronto, isto está perfeitamente certo. Agora há uma coisa que, pelo menos por enquanto, ninguém me convence que se pode pedir a um algoritmo. O algoritmo não viveu. O algoritmo pode, por exemplo, perante o Jorge, estando numa situação de luto que está a ser difícil ultrapassar, etc. O algoritmo pode ter milhares de frases de apoio.

JORGE C 01:03:20 Mas não sofre como muitos sofremos.

JMV 01:03:22 Mas nunca passou por isso. E aí depende da pessoa. Por exemplo, uma coisa que vai ser interessante verificar. Nós temos alguns estudos que dizem que nas camadas mais jovens, as camadas mais jovens querem respostas mais rápidas e que eventualmente não valorizam tanto isso. Mas há uma coisa que lhe digo aquilo que você sente, porque eu passei por lá, como todos nós já passamos. Aquilo que você sente com um ser humano que o apoia, às vezes até com um silêncio, mas que você, com razão ou sem ela, pressente. Este tipo está a entender, está aqui para mim, etc.

JORGE C 01:04:07 Há um vínculo e.

JMV 01:04:08 Se isso não é possível com a inteligência artificial. E agora cuidado porque pode dizer ainda hoje eu respondi isso a um convite gentil que me que me endereçaram para uma conferência para comparar e então dizia o confronto entre inteligência artificial e uma pessoa da geração e disse Eu não vou fazer confronto nenhum, porque para mim não há confronto, somos complementares. Agora, você também tem hoje em dia artigos médicos que dizem no futuro, os médicos serão substituídos por algoritmos, por por máquinas, porque elas têm inclusivamente uma vantagem e que são isentas. Não há desconfianças em relação a elas. São melhores em termos de segredo médico. Tudo o que quiser.

JORGE C 01:04:55 Não tenha sentimentos.

JMV 01:04:59 Eu, na minha idade e ainda por cima sendo um tipo preguiçoso, eu hoje em dia nunca vou procurar novos exemplos. Nunca, nunca é uma palavra que nunca se deve dizer, mas é muito raro. Eu reenvio a filmes e livros também, mas há filmes que envelhecem, estão datados e há outros que resistem. Se você for rever O20012011 ser no espaço, você vê quão genial aquilo é.

JMV 01:05:35 Podia não ter mais nada. Mas o que é que tem? Tem um computador que não está disponível para ser desligado? Computador Esse cometeu um erro, mas tem instinto de sobrevivência. Quer dizer, a mim não me desligam. E se bem se lembram, ele lê nos lábios e começa a acertar o passo a todos. Um safas. O que é que faz? Vai desligá lo? E esta cena é genial. Claro, para um psiquiatra é fascinante. Ainda mais porque o Kubrick ou o argumentista. Confesso que não sei se o argumento é do Kubrick. Ele dá uma visão antropomórfica da máquina. A máquina primeiro pede, não desliga, faz promessas. Eu nunca mais faço mal a ninguém. Eu nunca mais engano, argumenta e argumenta num tom de afeto. Mas o mais genial de tudo é que, à medida que ele vai desligando, a máquina vai regredindo à infância. Lembra se e acaba a dizer Eu fui construído pelo engenheiro não sei quê no sítio estatal. Isto é espantoso, mas nunca acontecerá porque a máquina não se pode sentir a morrer e a ter a nostalgia da infância porque não a viveu.

JMV 01:06:59 Dir me ão em 90% dos casos isso não tem importância nenhuma. Dou de barato. Mas chamar empatia a qualquer coisa que se passa entre quem viveu com nódoas negras e com grandes alegrias. E quem ouviu as nódoas negras aprendeu as respostas adequadas, mas não as sentiu. Não é a mesma coisa a empatia.

JORGE C 01:07:23 A par das nódoas negras e das grandes alegrias, são provavelmente a única receita para a partilha entre seres humanos. Compreender os outros implica nos a todo o momento e as máquinas capazes de calcular rapidamente, muito rapidamente e guardar acervos de informação gigantescos. Não têm alma. Podem saber, podem fingir, mas nunca sentiram a palpitação dos grandes amores, nem o sabor das lágrimas amargas, nem sequer lágrimas de óleo ou taquicardias eléctricas.

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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL MUDARÁ A NOSSA SAÚDE? RICARDO BAPTISTA LEITE
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