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Investigação da PF escancara risco de ruptura democrática vivido pelo Brasil, avaliam historiadores
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O relatório sobre a tentativa de golpe de Estado no Brasil já está nas mãos da Procuradoria-Geral da República que vai analisar se cabe denúncia contra 37 pessoas, entre elas o ex-presidente Jair Bolsonaro. A RFI conversou com três especialistas que avaliaram como robustas as apurações da Polícia Federal, mas há não consenso sobre a condução do julgamento.
Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília
Mesmo que o teor já fosse conhecido, as mais de 800 páginas com detalhes da investigação da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe são atordoantes, pois escancaram o risco de ruptura que o país viveu, no perigoso tripé: um presidente populista em conluio com integrantes das Forças Armadas, tendo apoio de parte significativa dos brasileiros.
Outros episódios já haviam provocado torpor que, pelas apurações que seguem agora para o Ministério Público, parece que faziam de fato parte do mesmo tronco golpista, como a invasão aos prédios públicos no 8 de janeiro de 2023 a fim de pressionar o comando do Exército a aderir à empreitada.
Para o historiador Francisco Teixeira, da URFJ, a citação a Jair Bolsonaro como peça-chave da suposta trama não surpreende. “Nunca foi segredo que ele era um admirador do golpe militar de 1964, o qual defendeu negando a existência de sequestro, tortura e mortes. O ideal de Bolsonaro sempre foi restabelecer o regime militar. Falou-se muito tanto ele, quanto os filhos, quanto o general Augusto Heleno, que foi ministro, inclusive em reeditar o ato institucional número 5, que foi o elemento central da estrutura jurídica que colocou em pé a ditadura militar”.
Para Teixeira, as ações do grupo investigado mostram o risco que o país correu. “Se o presidente, o vice-presidente e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral seriam mortos, sequestrados, o que poderia acontecer com os militantes de base, com os sindicalistas, professores, com intelectuais que se levantaram contra Bolsonaro? Nós teríamos um banho de sangue”, analisa.
Outro analista ouvido pela reportagem, o professor de filosofia Nelson Gonçalves Gomes, da Universidade de Brasília, afirmou que as instituições do país passaram por um teste e, em breve, vão enfrentar outro. “A Polícia Federal fez uma investigação que demorou cerca de dois anos e, ao que parece, essa investigação foi bastante cuidadosa. Se ela estiver correta, houve sim uma tentativa de golpe e as instituições do Brasil resistiram bem a esse, digamos assim, teste de stress. E o golpe não se realizou porque figuras centrais das Forças Armadas disseram que não apoiariam esse tipo de iniciativa”, aponta o professor de filosofia.
Divergência sobre imparcialidade do STF
Para Gonçalves Gomes, o que se espera é que o assunto seja concluído e que os responsáveis sejam levados a julgamento. “E aí é absolutamente fundamental que, culpados ou não, que tenham acesso a um julgamento justo. Esse é o próximo teste de stress ao qual as instituições brasileiras estarão submetidas. E é importante que esse julgamento seja feito por juízes imparciais. Obviamente a questão se torna muito difícil porque no Supremo Tribunal Federal a questão da imparcialidade se torna bastante dramática”, avalia.
Já o historiador Antônio Barbosa, da UnB, não vê problemas em Alexandre de Moraes julgar o caso: “Eu não vejo empecilho maior nisso. Por mais que Moraes tenha sido pretensamente alvo da ação dos golpistas, acho que ele já demonstrou uma capacidade extraordinária e uma coragem cívica de combater esse golpismo reacionário, esse golpismo de extrema direita no Brasil”, defende.
O historiador da UnB diz que as condições do golpe foram criadas ao longo dos quatro anos de mandato de Bolsonaro: “Desde o momento em que tomou posse até o último dia do seu governo, Jair Bolsonaro pregou o golpe. Ele dava a indicação de que na sua cabeça o que funcionaria era um regime de força, um regime autoritário. O trabalho de investigação da Polícia Federal desnudou tudo isso, com provas extremamente robustas.”
“Para isso o então presidente fez um governo que cooptou crescente número de militares, especialmente do Exército, para estar perto dele, inclusive recebendo vantagens pecuniárias. E estimulou os seus seguidores no Brasil inteiro a acreditar que o poder Legislativo e, principalmente, o poder Judiciário atrapalhavam o país, criando um caldo de cultura altamente favorável a um golpe de Estado”, afirmou Barbosa.
Repercussões políticas
As revelações tiveram grande repercussão até porque para a Polícia Federal o ex-presidente teve participação ativa nessa história. O deputado Coronel Chrisóstomo, do PL, minizou as acusações, pedindo clemência: “Não existe isso em nenhuma parte desse universo. Nenhuma nação tem condições de dar golpe com seis militares, independente dos poderes. Vamos esquecer cores e partidos, pensar no Brasil, nos brasileiros, nos que estão passando dificuldade, nos que estão presos sem dever nada. Inclusive está na hora da anistia”, bradou o parlamentar do PL.
"Paz de cemitério"
“Agora a gente está ouvindo que eles querem anistia para pacificar o Brasil. Ora, ora, a paz que vocês querem é a paz dos cemitérios, assassinando seus adversários políticos. Nós não podemos admitir. É sem anistia. Essa gente tem que pagar por todos os crimes que cometeram. Porque se tiver anistia, nós dizer ao Brasil, façam de novo. Como foi a ditadura militar de 64”, retrucou a deputada petista Gleisi Hoffman. Já o deputado bolsonarista Nikolas Ferreira (PL) entoou o coro repetido no ninho bolsonorista: “ministro do STF hoje decide sobre tudo. Não espero que vocês sejam perseguidos como estamos sendo agora nesse momento, porque eu sou contra qualquer tirania. Enquanto isso, vocês ficam aí dizendo golpe, golpe e não sabe nem me falar qual prova deste tal de golpe”, acusou.
O deputado Lindbergh Farias do PT também comentou o caso: “Esse relatório está todo com prova, muito depoimento, muita gravação. E olha, a gente só vai ter uma democracia verdadeira nesse país se a gente prender esses militares e se mudar a Constituição, para afastar definitivamente os militares da vida política nacional”, pontuou.
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O relatório sobre a tentativa de golpe de Estado no Brasil já está nas mãos da Procuradoria-Geral da República que vai analisar se cabe denúncia contra 37 pessoas, entre elas o ex-presidente Jair Bolsonaro. A RFI conversou com três especialistas que avaliaram como robustas as apurações da Polícia Federal, mas há não consenso sobre a condução do julgamento.
Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília
Mesmo que o teor já fosse conhecido, as mais de 800 páginas com detalhes da investigação da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe são atordoantes, pois escancaram o risco de ruptura que o país viveu, no perigoso tripé: um presidente populista em conluio com integrantes das Forças Armadas, tendo apoio de parte significativa dos brasileiros.
Outros episódios já haviam provocado torpor que, pelas apurações que seguem agora para o Ministério Público, parece que faziam de fato parte do mesmo tronco golpista, como a invasão aos prédios públicos no 8 de janeiro de 2023 a fim de pressionar o comando do Exército a aderir à empreitada.
Para o historiador Francisco Teixeira, da URFJ, a citação a Jair Bolsonaro como peça-chave da suposta trama não surpreende. “Nunca foi segredo que ele era um admirador do golpe militar de 1964, o qual defendeu negando a existência de sequestro, tortura e mortes. O ideal de Bolsonaro sempre foi restabelecer o regime militar. Falou-se muito tanto ele, quanto os filhos, quanto o general Augusto Heleno, que foi ministro, inclusive em reeditar o ato institucional número 5, que foi o elemento central da estrutura jurídica que colocou em pé a ditadura militar”.
Para Teixeira, as ações do grupo investigado mostram o risco que o país correu. “Se o presidente, o vice-presidente e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral seriam mortos, sequestrados, o que poderia acontecer com os militantes de base, com os sindicalistas, professores, com intelectuais que se levantaram contra Bolsonaro? Nós teríamos um banho de sangue”, analisa.
Outro analista ouvido pela reportagem, o professor de filosofia Nelson Gonçalves Gomes, da Universidade de Brasília, afirmou que as instituições do país passaram por um teste e, em breve, vão enfrentar outro. “A Polícia Federal fez uma investigação que demorou cerca de dois anos e, ao que parece, essa investigação foi bastante cuidadosa. Se ela estiver correta, houve sim uma tentativa de golpe e as instituições do Brasil resistiram bem a esse, digamos assim, teste de stress. E o golpe não se realizou porque figuras centrais das Forças Armadas disseram que não apoiariam esse tipo de iniciativa”, aponta o professor de filosofia.
Divergência sobre imparcialidade do STF
Para Gonçalves Gomes, o que se espera é que o assunto seja concluído e que os responsáveis sejam levados a julgamento. “E aí é absolutamente fundamental que, culpados ou não, que tenham acesso a um julgamento justo. Esse é o próximo teste de stress ao qual as instituições brasileiras estarão submetidas. E é importante que esse julgamento seja feito por juízes imparciais. Obviamente a questão se torna muito difícil porque no Supremo Tribunal Federal a questão da imparcialidade se torna bastante dramática”, avalia.
Já o historiador Antônio Barbosa, da UnB, não vê problemas em Alexandre de Moraes julgar o caso: “Eu não vejo empecilho maior nisso. Por mais que Moraes tenha sido pretensamente alvo da ação dos golpistas, acho que ele já demonstrou uma capacidade extraordinária e uma coragem cívica de combater esse golpismo reacionário, esse golpismo de extrema direita no Brasil”, defende.
O historiador da UnB diz que as condições do golpe foram criadas ao longo dos quatro anos de mandato de Bolsonaro: “Desde o momento em que tomou posse até o último dia do seu governo, Jair Bolsonaro pregou o golpe. Ele dava a indicação de que na sua cabeça o que funcionaria era um regime de força, um regime autoritário. O trabalho de investigação da Polícia Federal desnudou tudo isso, com provas extremamente robustas.”
“Para isso o então presidente fez um governo que cooptou crescente número de militares, especialmente do Exército, para estar perto dele, inclusive recebendo vantagens pecuniárias. E estimulou os seus seguidores no Brasil inteiro a acreditar que o poder Legislativo e, principalmente, o poder Judiciário atrapalhavam o país, criando um caldo de cultura altamente favorável a um golpe de Estado”, afirmou Barbosa.
Repercussões políticas
As revelações tiveram grande repercussão até porque para a Polícia Federal o ex-presidente teve participação ativa nessa história. O deputado Coronel Chrisóstomo, do PL, minizou as acusações, pedindo clemência: “Não existe isso em nenhuma parte desse universo. Nenhuma nação tem condições de dar golpe com seis militares, independente dos poderes. Vamos esquecer cores e partidos, pensar no Brasil, nos brasileiros, nos que estão passando dificuldade, nos que estão presos sem dever nada. Inclusive está na hora da anistia”, bradou o parlamentar do PL.
"Paz de cemitério"
“Agora a gente está ouvindo que eles querem anistia para pacificar o Brasil. Ora, ora, a paz que vocês querem é a paz dos cemitérios, assassinando seus adversários políticos. Nós não podemos admitir. É sem anistia. Essa gente tem que pagar por todos os crimes que cometeram. Porque se tiver anistia, nós dizer ao Brasil, façam de novo. Como foi a ditadura militar de 64”, retrucou a deputada petista Gleisi Hoffman. Já o deputado bolsonarista Nikolas Ferreira (PL) entoou o coro repetido no ninho bolsonorista: “ministro do STF hoje decide sobre tudo. Não espero que vocês sejam perseguidos como estamos sendo agora nesse momento, porque eu sou contra qualquer tirania. Enquanto isso, vocês ficam aí dizendo golpe, golpe e não sabe nem me falar qual prova deste tal de golpe”, acusou.
O deputado Lindbergh Farias do PT também comentou o caso: “Esse relatório está todo com prova, muito depoimento, muita gravação. E olha, a gente só vai ter uma democracia verdadeira nesse país se a gente prender esses militares e se mudar a Constituição, para afastar definitivamente os militares da vida política nacional”, pontuou.
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